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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

O dia em que o terrível Godofredo assassinou a impressora

Godofredo sempre foi um cara descontraído metido a intelectual. Namorador que só. Frequentava as mais diversas rodas políticas na década de 80 e participou de momentos importantes da vida política do país.

Após várias tentativas sem sucesso, Godofredo descobriu que era um homem de negócios e meteu na cabeça que ia ser empresário. Começou lá embaixo e após alguns anos de trabalho conseguiu montar um império, pelo menos para quem veio de baixo. Aos poucos sua empresa cresceu, a base de mais valia, é claro e ele se se tornou um empresário de sucesso. Batia no peito e dizia que era fruto da sua inteligência, esforço e dedicação pessoal. Apesar de tratar seus funcionários à bordoada, dizia ser necessário, pois se não fizesse assim a empresa não vingaria e todos que o criticavam ficariam sem trabalho.

Não cofiava em ninguém. Nem mesmo na sua sombra. Uma das coisas que chamava a atenção de todos era o que ocorria de anormal quando Godofredo entrava em seu estabelecimento industrial. Lá fora ele era o Godofredo: o cara bonzinho, o político bem informado, o amigo e camarada de todos. Vivia rindo a toa. Porém, quando Godofredo passava pelo limite da porta que dividia o dentro e o fora da sua empresa, algo de muito estranho acontecia. Uma espécie de entidade do mal dele se apoderava. Mudava a voz, o jeito de andar e principalmente o olhar para os funcionários, impondo medo. A partir daquele momento não era mais o Godofredo amigo e sim o Sr. Godofredo o “Diretor Presidente”.

Para provar que ali o Godofredo era a lei, começava logo cedo a xingar os funcionários que via pela frente: “Vamos trabalhem, que moleza é essa? Quero produção, produção!. Tá muito fraco!” “Só faz coisa errada, que litígio é esse cara?”. “Ah isso aqui vai mudar, ah se vai! Quem não se enquadrar vai pra rua” “Quer ser mandado embora, quer”? Enfim fazia o percurso, da produção da sua empresa desclassificando todo mundo, simplesmente para provar quem manda no pedaço. Godofredo simplesmente se transformava num monstro.

Godofredo é mesmo uma daquelas figurinhas carimbadas. Certa vez começou a brigar com um de seus irmãos, tão louco quanto ele e começaram a xingar as mães, como se fossem mães diferentes. Gritavam: “Um falava: sua mãe é isso e o outro respondia: é a sua. Vem falar aqui vem? E o outro respondia: venha você para eu partir sua cara. Sua mãe deve ter se arrependido de ter te gerado seu infeliz. E a sua deve se envergonhar do traste que gerou.” E a coisa foi ficando cada vez mais tensa. Em dado momento a coisa foi para as vias de fato.

Godofredo para provar que era melhor e mais forte que o irmão, derrubou de cara uma prateleira tipo torre, cheia de ferramentas e essas se espalharam pelo chão da fábrica. Foi um corre-corre geral para apanhá-las. Parecia que as ferramentas tinham vida e queriam fugir daqueles insanos.

O irmão de Godofredo começou a correr atrás dele (que cena fantástica) dizendo: “Vou te pegar seu miserável. Não sobrará nada para contar a história”. Para se defender Godofredo que não é bobo nem nada, buscou proteção do lado de dentro do escritório. Escondeu-se atrás da porta. Ele xingando a mãe do irmão de um lado e o irmão por sua vez xingando a mãe dele de outro. Como cada um esmurrava a porta com mais força, como se fosse ao outro, a porta que era de ferro dobrou ao meio. Parecia de lata. E aí cara a cara, antes que um matasse o outro, chegou a turma do deixa disso e separou aquelas criaturas, que ficaram se  jurando. “Você não e homem, dizia um e o outro respondia: vem aqui pra eu provar”. A porta imprestável, foi para o ferro velho, pois não havia mais conserto.

Tudo isso já era o suficiente para internar aquele maluco que tratava sua empresa como um verdadeiro manicômio. Os funcionários perguntavam baixinho uns para os outros: “cadê o doido já chegou?” E nas rodas de conversa ele era o assunto do dia.

Porém, algo muito mais louco e hilário estava para acontecer. Alguém que não tinha vida própria estava para ser assassinada: uma pobre impressora Epson LX 300.

Naquele dia Godofredo amanheceu doidão. Espumava de raiva. Estava de mal com o mundo. Já tinha brigado com a empresa inteira. Em dado momento empurrou a porta do escritório bruscamente e entrou apressado procurando um relatório. Chegou perto de um garoto que tinha entrado há pouco tempo e estava se formando para pastor e falou: “Cadê o relatório cara?” O garoto pálido de medo gaguejava: “Sensenhor Gogogodofredo...aaa impressossora quebrou....” Godofredo vermelho como um pimentão, coçou a barba e com um sorriso irônico esbravejou: “CARA VOCÊ AINDA NÃO CHAMOU O TÉCNICO PARA CONSERTAR ESSA P.... DE IMRESSORA. QUE LITIGIO É ESSE?” e o garoto quase chorando dizia: “Ainda não Seu Godofredo, desculpe. Ainda não consegui falar com Seu Barbosa”. E Godofredo aos berros disse o seguinte: “ISSO É UMA VERGONHA. É UMA INCOMPETÊNCIA. AQUI TODO MUNDO É INCOMPETENTE. VOLTAREI DAQUI A DEZ MINUTOS E SE ALGUÉM NÃO TIVER RESOLVIDO ESSA SITUAÇÃO EU MESMO VOU RESOLVER. VOCÊ VAI VER”.

O garoto tremendo de medo ligava para seu Barbosa e nada dele atender. Estava em pânico. Dizia quase chorando: “E agora. E agora. Seu Godofredo vai me matar. Ai meu Deus me ajuda e começou a orar com a mão postada, ora para a impressora e ora para a porta com medo do Godofredo entrar”.

Os dez minutos se passaram e o garoto não conseguiu resolver o problema. De repente, quase pondo a porta abaixo aparece Godofredo, pisando duro e lá de longe gritou: “Conseguiu resolver cara?” e o garoto abanando a cabeça dizia não. Nem conseguia falar de tanto medo.

Godofredo calmamente veio em direção à impressora. Caminhava se balançando de um lado para o outro com seu barrigão, fazendo um barulho na boca como se estivesse limpando os dentes. Era uma impressora daquelas de imprimir formulários contínuos. Tirou-a calmamente da tomada, levou às costas segurando-a pelo cabo e antes que alguém falasse alguma coisa começou a bater a impressora no chão com uma força descomunal. Bateu: uma, duas, três, quatro, cinco, infinitas vezes.

Uma cena arrepiante. Dava vontade de rir e chorar ao mesmo tempo, vendo aquela figura parecendo um galo de briga em cima da pobre impressora. Godofredo fazia isso e gritava: “TOMA, TOMA, SUA IMPRESSORA MALDITA. OLHA AQUI O QUE EU FAÇO COM VOCÊ. SE NÃO TEM TÉCNICO PRA TE CONSERTAR EU TE CONSERTO PRA SEMPRE. VAI PRO INFERNO SUA MALDITA. VOCÊS TODOS SÃO CULPADOS POR ESSA CENA. MAS VOU RESOLVER, PORQUE EU SEMPRE RESOLVO, AH SE RESOLVO!”. Nesse instante várias pessoas estarrecidas assistiam aquela cena. Godofredo com seu corpão avantajado agora dava pulinhos em cima do que tinha restado da pobre impressora e gritava: “NÃO SOBRARÁ CACO SOBRE CACO. Vou acabar com tudo”. “ESSA EMPRESA UM DIA VAI MUDAR, OU NÃO ME CHAMO GODOFREDO”.

Após uns dez minutos pulando em cima dos cacos, Godofredo descobriu que ainda tinha sobrado o rolo da impressora e uma espécie de esqueleto da mesma. O que fez Godofredo? Abriu a porta, passou pelo portão de entrada da empresa e foi até o poste mais próximo. Segurando o que restou pelo cabo começou a bater fortemente no poste gritando: “ACABOU, ACABOU, NÃO SOBROU NADA, CHAMA A MULHER DA LIMPEZA. NÃO ERA ISSO QUE VOCÊS QUERIAM? AGORA TÁ FEITO! TÁ FEITO! ACABOU!”.

Quando não havia mais quase nada para destruir, Godofredo limpando as mãos, uma na outra, entrou calmamente na empresa sem olhar para ninguém, subiu a escada, sentou-se na sua mesa de trabalho e começou a trabalhar normalmente como se nada tivesse acontecido. Como se tudo aquilo tivesse sido apenas uma terapia.

Tempos depois, Godofredo contava isso pra todo mundo como se fosse uma resposta aos funcionários incompetentes que tinha e que não conseguiam sequer chamar um técnico para consertar uma impressora. Por outro lado, seus funcionários e conhecidos, além de dar muitas risadas, que rendem altas gargalhadas até hoje, diziam que o problema não é você ser empregado, o problema de fato é ter um patrão como o Godofredo, que ninguém respeitava, apenas morria de medo na frente dele, mas rachavam de rir quando ele dava as costas. Um verdadeiro fanfarrão.

Para entender esse maluco só lendo Michel Focault. Em seus estudos Focault segure que o poder está à margem da loucura é por isso que todo maluco muda a voz, jeito de andar, de se vestir e, sobretudo de amigos.

O pior é saber que o deus mercado está cheio de gente como o Godofredo. Dá para se ter respeito por um tipo desses?


Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Coordenador do Programa de Capacitação Continuada
em Gestão Pública e Social da Fundação Perseu Abramo
toni.cordeiro1608@gmail.com

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