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terça-feira, 27 de março de 2018

As inquietudes da ausência que invadem a nossa essência

A partir do entendimento do momento atual, dá para viver sem inquietar-se? 

Inquieto-me pela destruição das conquistas de mais de cem anos de lutas, mas muito mais por ocasião da ausência de questionamentos organizados por parte da maioria da população brasileira que perdeu praticamente tudo. Isso provoca entre outras situações, uma invasão na essência humana para quem veio ao mundo a trabalho e continua lutando por uma causa humanista e de igualdade.

Parto da avaliação da existência de uma séria crise de identidade na sociedade brasileira, advinda de vários fatores e de diversas matrizes, principalmente ideológicas e isso faz com que em muitas situações, inúmeras pessoas mais pareçam transeuntes de uma terra de ninguém do que habitantes de um planeta que se propõe a viver em harmonia. Além disso, uma grande parte da população não possui um projeto de vida. Apenas vive. Isso faz com que o caos mostre sua verdadeira face e avance sobre os sonhos das pessoas.

Essas transformações a meu ver estão modificando profundamente o estado emocional de um contingente enorme da população, com prejuízos incalculáveis para o emocional e também para o mental, tornando as pessoas alvos fáceis do “sistema” e principalmente de seus agentes. Um dos eventos observados vem da ausência quase completa dessas pessoas do entendimento dos códigos do poder e isso provoca, entre outros fatores, o desinteresse completo da vida cotidiana, da política e dos políticos.

Grandes perguntas que nos vêm em mente: Esse desinteresse é consciente ou construído lentamente pelas forças dominantes? Para o “sistema”, esse processo de ausência de lutas concretas é uma coisa boa ou ruim? Como intervir? Podemos definir tudo isso como um processo de letargia?

Por definição, ausência pode ser entendida como ação de afastar-se de algo ou de alguém, mas também pode ser se ausentar de si. Andar de forma atabalhoada pelos corredores da vida, meio que sem rumo. Ou ainda a ausência provocada pelo desprezo humano que produz estragos emocionais nas pessoas acometidas, muitas vezes irreversíveis. É preciso amar a vida para poder amar a causa.

Por ser um tema tão complexo, esse post não tem a pretensão de se enveredar pela área da saúde e tampouco psicológica para explicar sobre as diversas formas de ausência, mas buscar entendimentos que nos ajude a entender essa paralisia geral que acomete grande parte da população brasileira.

Um dos caminhos possíveis dessa letargia pode vir da ausência de emoções e indiferença a tudo, que é uma patologia, que consiste em regras gerais, num desinteresse total de tudo e de todos. Nesse caso não há emoções em jogo ou em disputa. Pode ser causada, por exemplo, pela falta de qualidade das relações interpessoais e de sonhos desfeitos, gerando o que a medicina chama de Transtornos de Humor.

Porém, será que isso é suficiente para entendermos essa crise de ausência nas ruas? Como explicar então se as ruas enchem quando a Globo chama a população para pular diante de um pato, escondendo as verdadeiras razões dos problemas do país?

Vamos por outro caminho. E se tiver ocorrendo um controle e manipulação das massas, numa ação ordenada por quem provocou essa enorme crise e por seus aliados? Vejam o que diz Noam Chomsky:

“Um estado totalitário não se importa com o que as pessoas pensam desde que o governo possa controlá-la pela força usando cassetetes. Mas num estado democrático, quando você não pode controlar as pessoas pela força, você tem que controlar o que as pessoas pensam e a maneira típica de fazer isso é através da propaganda (fabricação de consentimento, criação de ilusões necessárias), marginalizando o público em geral ou reduzindo-a a alguma forma de apatia”.

Inspirado nas ideias de Chomsky, o francês Sylvain Timsit elaborou a Lista das 10 estratégias mais comuns de manipulação em massa através dos meios de comunicação de massa:

1. Estratégia da Distração: Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por temas sem importância real.

2. Criar problemas e depois oferecer soluções: Se cria um problema, uma “situação” prevista para causar certa reação no público, a fim de que este seja o mandante das medidas que se deseja aceitar.

3. Estratégia da Gradação ou da Gradualidade: Para fazer que se aceite uma medida inaceitável, basta aplicá-la gradualmente, a conta-gotas, por anos consecutivos. 

4. Estratégia do Diferimento: Outra maneira de se fazer aceitar uma decisão impopular é a de apresentá-la como “dolorosa e necessária“, obtendo a aceitação pública, no momento, para uma aplicação futura.

5. Tratar o público como se fosse criança: A maioria da publicidade dirigida ao grande público utiliza discurso, argumentos, personagens e entonação particularmente infantismuitas vezes próximos à debilidade.

6. Utilizar o aspecto emocional muito mais do que a reflexão: Fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para causar um curto circuito na análise racional, e finalmente no sentido crítico dos indivíduos.

7. Manter o público na ignorância e na mediocridade: Fazer com que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para seu controle e sua escravidão.
8. Estimular o público a ser complacente com a mediocridade: Promover ao público a crer que é moda o ato de ser estúpido, vulgar e inculto. Introduzir a ideia de que quem argumenta demais e pensa demais é chato e mal humorado, que lhe falta humor de sorrir das mazelas da vida. 

9. Fortalecer a culpa: Fazer com que o indivíduo acredite que somente ele é culpado pela sua própria desgraçapor causa da insuficiência de sua inteligência, de suas capacidades, ou de seus esforços. Aqui a meritocracia se encaixa como uma luva.

10. Conhecer melhor os indivíduos do que eles mesmos se conhecem: O sistema tem conseguido conhecer melhor o indivíduo comum do que ele conhece a si mesmo. Isto significa que, na maioria dos casos, o sistema exerce um controle maior e um grande poder sobre os indivíduos, maior que dos indivíduos sobre si mesmos.

Minhas inquietações se tornam mais aguçadas quando me convenço que o golpe em curso no Brasil nada tema ver com Temer ou com a politicalha do momento e sim o Consenso de Washington estruturado em 1989, assim como também me inquieto quando me convenço que a ausência do povo das ruas no combate à destruição de suas conquistas se dá por um processo de manipulação e alienação promovido pelos agentes do “sistema”.

Para combater esse estado de abandono e desagregação popular, só uma grande dose de formação política cidadã, que seja capaz de intervir e motivar outras pessoas. Algo que as conquistem pelo conhecimento, ajudando-as a entenderem o “sistema” e a se defenderem da opressão presente na atualidade em cada esquina, assim como tomarem tento e lutarem pelos seus direitos.

Finalizo essa conversa com duas frases de Maquiavel: “Um povo corrompido que atinge a liberdade tem maior dificuldade em mantê-la”. “Para bem conhecer o caráter do povo é preciso ser príncipe e para bem conhecer o do príncipe é preciso pertencer ao povo”.

Vídeo - As dez estratégias de manipulação das massas de Noan Chonsky
https://www.youtube.com/watch?v=xBVUBJXWXWY  

Antonio Lopes Cordeiro
Pesquisador em Gestão Pública e Social

terça-feira, 6 de março de 2018

Esperança - Esperar ou Esperançar?

Mais uma vez enveredo na escrita para falar de esperança. Um termo saliente, que caminha com os humanos, ora como a energia da certeza e ora como um pretexto para a espera.

Esperancei no texto “Um brinde a esperança”, buscando suas melhores afirmações e desta vez busco contextualizar se o ato de esperançar vem como a esperança da crença ou como a espera da incerteza. Duas linhas tênues, quase imperceptíveis da esperança que nascem juntas, porém com conotações completamente diferentes em termos de comportamento humano. Quem esperança persevera e quem espera aposta no acaso.
O filósofo Mário Sergio Cortella dialoga com essa dualidade ao afirmar que uma coisa é ter esperança do verbo esperar e a outra, bem diferente, é ter esperança do verbo esperançar, pois esperança do verbo esperar é apenas espera e esperança do verbo esperançar é juntar fé com determinação, vencer obstáculos e a ação de caminhar rumo ao que se almeja para o amanhã.
Esperança por definição é almejar, sonhar, buscar, agir e assim esperança busca contorno para se tornar o contrário de espera, pois enquanto esperança do verbo esperançar é vida em movimento, esperança do verbo esperar é passividade. Enquanto esperança é ação, espera é solidão.
Tu já pensaste nisso? Já parasse para pensar se tua esperança não é daquelas que só espera o que almejas, mas nada fazes para que aconteça?
Se fôssemos analisar do ponto de vista de uma causa, esperança do verbo esperançar poderia ser uma caminhada junto com a missão, monitorando os contratempos e ao mesmo tempo se deleitando com os resultados positivos. Enquanto isso esperança do verbo esperar, provavelmente faria com que o tempo fosse senhor da razão e os obstáculos justificassem a falta de conquistas.
Ao navegar pelo Rio Tapajós a caminho de Itaituba no Pará e de volta à Santarém, observando a paisagem, onde parte dela se encontra destruída pela ganância humana, tive a oportunidade de refletir sobre missão e causa e cheguei à conclusão que assim como a esperança é confundida com espera, a missão é confundida com a desobrigação de viver, como se nascêssemos para o nada ou ainda sem nenhuma razão que pudesse dar sentido à causa.
Ás vezes nos distraímos com a vida e esquecemos de dar consistência a tudo que produzimos, ou ainda nos esquecemos de dar importância a nós mesmos e com isso passamos a esperar que as coisas aconteçam, ao invés de agirmos para que ocorram. Isso além de ser um vício cultural, para quem luta por uma causa acaba também se tornando um desvio político, pelo menos para quem se propõe a lutar uma por uma nova sociedade e não se prepara para isso.
Porém, do ponto de vista da nossa existência o que é mesmo a esperança? Será que sabemos esperançar? Será que as nossas crenças são maiores que as nossas desilusões? Onde buscamos entendimento que corrijam nossos comportamentos de descrença por falta de confiança própria?
Esperança do verbo esperar é jogar com o futuro. É simplesmente se adaptar aos problemas da vida e porque não dizer fugir do problema central, que às vezes está a um palmo da nossa compreensão. Enquanto isso, esperança do verbo esperançar é vida que surge, caminhos que se abrem, veredas como alternativas para encurtar caminhos. Esperançar é antes de tudo crer na vida e na possibilidade de se refazer sempre.
Minha esperança vem da certeza da luta concreta aprendida à duras penas e busca consistência nas ruas junto com as pessoas mais necessitadas, irmanadas em busca dos sonhos perdidos. Vem dos sonhos de mudar a sociedade rumo a uma sociedade justa, fraterna e igual para todos e todas. Vem do sorriso aberto das pequenas conquistas e da esperança que o melhor ainda está por vir.
Tenho o sentimento que um menino ou uma menina provavelmente tem esperança de ser tudo na vida, o adulto tem esperança que a vida prospere e as pessoas idosas tem esperança que seus ensinamentos e experiências de vida sirvam de exemplo, pelo menos para os seus.
Esperança a meu ver nasce da decisão de querer mudar, da certeza que podemos ser o que quisermos ser, na medida em que vamos conquistando confiança e aprimorando a plenitude de nossa missão. Esperança é chama que se renova, antes que nossa disposição e crença cedam para a desilusão.
Espero esperança que possamos esperançar juntos, que dialoguemos com as diversas vozes que tenta nos desviar do caminho que traçamos juntos.
A esperança sozinha é como uma nuvem passageira. Junto com o otimismo e a disposição de lutar se transforma na energia necessária para a construção de um novo amanhã. É preciso agir com a esperança, antes que ela vire espera.
Finalizo buscando Fernando Pessoa que escreveu: “Agir, eis a inteligência verdadeira. Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se não o fizerem ali?”.
Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Estatístico e Pesquisador em Gestão Pública e Social