Jocivaldo dos Anjos¹
Welcome!
Acordamos neste dia em que a Pauliceia desvairada celebra mais uma
primavera na Selva de Pedra, onde a “garoa rasga a carne naquela torre de
Babel”. Gosto daquela Babel e vez em quando vou naquele esgarçamento de línguas
e linguagens somente interpretadas pelo realismo. Quem chora ali mandam pra
casa ou pro saco. Ali é terra de pouco sentimentos. Terra de bandeiras e de
bandeirantes. De bandeirantes que adentraram as almas, mataram corpos e receberam
homenagens. Reinado do realismo machadiano. O real no real. Sendo de lá pode
ser o dólar, euro... no real. Assim é ela. A cidade que não dorme e odeia
romanticismo. Os românticos costumam dizer que “não existe amor em SP”. SP não
está nem aí para o amor. SP é razão. Quem quiser paixões que vá para outras
bandas do Brasil em que foi ensinada que “somente o amor constrói”. Não foi
amor o que construí nesta cidade o 1% mais rico do planeta. Não foi. Não foi
por amor que foi construído por lá o centro nervoso do capitalismo brasileiro.
Não foi por amor que o massacre do Carandiru contribuiu para a inauguração de
novas formas de relacionamentos entre encarcerados e encarcerados e sociedade.
Não é por amor que meu irmão levanta as 04:00 da manhã para trabalhar. Em São
Paulo somente o amor não constrói. Nem em canto nenhum. O amor é uma bazofia
criada para inglês (brasileiro ver). O axioma é sua falta. A retorica é sua
presença. Mas, de conversa bonita o céu está cheio. O inferno é a realidade. E
também: o inferno não são os outros. E, o quinto dos infernos ficou maior ainda.
Não é por amor que meus filhos podem estudar em escola privada. É pela
mensalidade que o meu corpo escravizado pelas possibilidades melhores que os
corpos escravizados de minha mãe e de meu pai me permitiram. Também não é por
amor que vou visita-los vez em quando. É pelas minhas condições de pagar as
passagens de deslocamentos entre a Soteropólis e a Gata Borralheira. O papo
hoje é reto. Na real.
Não sou pessimista. Apenas realista, de vez em quando. Afinal tem dias
que Machado deve ser de Assis. De Assis para mostrar que a preposição DE indica
que tem um dono. Não é Machado de todo mundo. É somente de Assis. Tem dono. No
capitalismo se tem quem tem. No capitalismo todo mundo tem um dono. Mesmo que
implícito. No capitalismo quem não tem dono é como aquele preto que não sofre
racismo. A isso a gente aprendeu a chamar, no realismo de burrice, cegueira,
escravidão adestrada... que leva a canalhice. Se faz por não saber não importa.
Errado é errado e acabou. Quem não sabe que trate de aprender e apreender. Crime
é crime e eu sou eu”. Quem pode ter tem. Quem pode dominar domina. Quem teve a
herança possui. Pronto! Então, vamos parar de sonhos para entendermos o que é
de quem e o que isso representa. De ressaca não se folga na segunda-feira,
necessariamente. De ressaca, no máximo, vai-se ao banheiro vomitar. Geralmente,
numa como a deste dia 25 de janeiro de 2018 vomita-se a bílis de fígado. Aquele
liquido gosmento verde que parece se rasgar parte do corpo a cada saída forçada
do corpo. Amarga demais. Dê mais. E não afasta de mim este cálice.
Se hoje é dia de ressaca é porque o de ontem foi de festa. Ontem, 24 de
janeiro de 2018 foi mais um dia da festa da história do Brasil. Já houve outros
momentos de festas, mas alguns se sobressai. Somente lembrarei de três para
ilustração: 23 de abril de 1500 (para celebrar a apropriação das terras,
corpos, almas e estupros de indígenas no Brasil; dia 14 de maio de 1988 para
celebrar a continuidade da escravidão no povo afro-brasileiro e, premiando isso
ainda com leis que permitisse prender os corpos cujos os machados de antanho
não conseguiu arrancar a cabeça e levar em praça pública. Por se falar em praça
pública (que é somente do povo rico.Dos plutocratas brasileiros) e cabeças
decepadas, lembremo-nos dia 22 de abril , que se sucedeu a arribada à Praça de
Ouro Preto a cabeça de mais um: Tiradentes foi o da vez. Desta forma, este dia
25 de janeiro de 2018 não é um ponto fora da curva. É mais um dia de nossa
história ressaqueada. Aliás, devemos afirmar também que como somos formados por
um positivismo cartesiano exacerbado, quem sente a ressaca não é quem estava no
banquete. É assim de quem estava trabalhando no banquete servindo aos donos da
festa e, já de corpo esguio e cansados, tomou um gole da pinga pior que tinha
pela manhã para voltar pra casa. Esta desceu queimando tudo e... continuou
bebendo pelo caminho até se chegar em casa. - Quem não ouviu aquela frase: eu
bebo e você embebeda? Nesta pegada!
Ontem houve festa no país. Houve até o CarnaLula. Esta festa foi nomeada
desta forma para celebrar a condenação do ex-presidente Lula por crime de
corrupção. A corrupção, como em outras datas, precisa de ser banida. Não toda a
corrupção. A seletiva corrupção. A corrupção que pode permitir o
reposicionamento de classes. O que pode, em alguma medida, permitir outras
inclusões na agenda de desenvolvimento nacional. Pensemos e entendamos. Nos EUA
o fim do apartheid foi fruto de que? No Brasil a criação dos programas de
inclusão é fruto de que? A contratação daquela banda para aquela festa é fruto
de que? – fruto da competência de quem conseguiu decifrar o enigma da esfinge.
Né naummmmm?
O convite agora não é invisível como em outros tempos. A implicitude
abre passagem para que nesta avenida passe o carro forte, com as notas verdes e
à frente haja negros fortes e bons em carros fortes melhores e armados até os
dentes para a defesa do carro e dos seus donos e de outros negros, afirmando
como quem manda quer que seja e quem é mandado deve agir. Tempos de razão. No
tempo da razão se racionaliza. Não se trata de um novo iluminismo. Mas, de um
iluminismo à Brasileira, que seja. Somente devo afirmar que é tempo da razão.
Necessariamente um iluminismo feito por quem foi objeto de estudo dos velhos
iluministas. Um neo-iluminismo. Na razão a razão dirige.
Na ressaca se toma chá de boldo. Não adianta dizer que não vai beber
nunca mais. (as drogas fazem parte das celebrações e do fugere humano). Não
adianta enjoar e passar o dia dormindo. Na ressaca a gente organiza para beber
a dose que se aguenta. Ou somente beber (até ficar de ressaca) quando puder
celebrar. Se não puder celebrar bastante, melhor não beber. Na ressaca a gente
já pode refletir, pois, apesar de estarmos de ressaca já estamos sóbrios. E, já
podemos ler Machado de Assis na ressaca e desligar o sertanejo universitário.
Na ressaca a é ex. e o ex. já tem outra mais nova e mais gostosa. Na ressaca a
economia solidária não resolve os problemas da parte superior do capitalismo.
Na ressaca a marginal deve servir somente para o acesso a via principal. Na
ressaca não há conciliação de classe e nem uma nova classe média. Na ressaca,
preto é preto, branco é branco, bicha é bicha, puta e puta, corno e corno e
veado é veado. Bem-vindos a ressaca. E não tomem chá de boldo para não permitir
embriagar novamente. Sem choros pelas palavras e coisa feitas nos momentos das
bebedeiras. Mesmo que por osmose.
Nunca vi ninguém ganhar nada chorando. Se ganha lutando dentro de uma
dada realidade. Dentro das possibilidades de se construir a história em Marx. Dentro
do sentimento de Potência em Nietzsche. Dentro das relações sociais em Machado.
Guardem os livros de romantismo. Queimem os de autoajuda. Liguem a TV (seja na
vênus platinada ou em qualquer outro partido do poder) A vida real é dura.
Muito dura. Duríssima. Bem-vindos. E, sem chororô. Sigamos!
1. Jocivaldo dos Anjos é aluno especial do
Doutorado em Administração Pública pela Universidade federal da Bahia – UFBA. jocinegao@hotmail.com
Belo Horizonte – MG –
Brasil, 25 de janeiro de 2018,
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