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terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Por onde anda a identidade do povo brasileiro?

Às vezes por necessidade de trabalho e outras por pura preocupação, paro só para pensar em como traduzir o complexo momento que vivemos no país. Sinto na alma que por mais que sorrisos vastos inundem o espectro do nosso dia a dia, há sem dúvidas uma grande dose de tristeza perambulando no imaginário de milhares de pessoas. Algo que além da tristeza traz junto uma profunda crise de identidade. Algo tão profundo que o mais tolo dos tolos um dia acordará e quem sabe se dará conta de que nem mesmo chão tem mais.

Como explicar que de uma hora para outra todas as lutas dos últimos cem anos foram suprimidas e comprometidas e como resultado apenas uma passividade absurda? Cadê o respeito a quem deu a vida para que se tivesse liberdade e melhores condições para o povo trabalhador? Como levar ânimo para quem perdeu o rumo das coisas e que ontem mesmo cantava suas conquistas em versos, prosas e muito consumo?

Talvez a resposta de algumas dessas perguntas esteja na leitura precisa que a professora Marilena Chauí fazia sobre a conjuntura da época, ao se referir ao conjunto de trabalhadoras e trabalhadores. Enquanto se vendia a ilusão que o país tinha produzido uma nova classe média, ela afirmava que se tratava apenas de uma nova classe trabalhadora, que tinha conquistado o que nunca teve acesso, mas estava longe de se afirmar como pertencentes à classe média, a qual caracterizava como uma verdadeira aberração.

Diria que foi uma doce ilusão que caminhou lado a lado com o povo sofrido brasileiro por algum tempo e por falta de lastro, consciência crítica e política e a necessidade de sair do individual para o coletivo tudo veio abaixo. O golpe em curso foi algo permitido e premeditado. Um golpe de classe que segue rigorosamente a restauração das dez metas estabelecidas no Consenso de Washington.  Uma fatídica reunião ocorrida nos EUA em 1989, que tinha como pressuposto básico a implantação do neoliberalismo na América Latina e no Caribe. Um projeto de sucesso com FHC e interrompido pelos governos Lula e Dilma. Esse foi e é o verdadeiro enredo do momento que vivemos.

O resultado disso nos leva a impressão de estamos dentro de um filme de terror, vivendo cada cena apavorante. É como se um monstro desenvolvido em laboratório tivesse sido criado em casa como um bicho de estimação. Ele cresceu e engoliu seus criadores. O que o povo conquistou nos últimos cem anos, perdeu em várias canetadas e votos pagos com o dinheiro do povo.

Ao vasculharmos a história do Brasil, extremamente mal contada ao longo do tempo, percebemos que têm em seu DNA, invasão, golpes e escrachos políticos de toda ordem, mas também muita luta. Muita gente se organizou para lutar por direitos e mudanças na política nacional ao longo de sua historia.

Apesar disso, existem enormes contradições que transitam no tempo na política tupiniquim, onde os herdeiros da casa grande e seus representantes sempre esconderam que usaram e usam a boa fé do povo brasileiro para os enganarem e se manterem no poder, enquanto uma grande parte dos de baixo sempre consentiram em troca de algumas benesses. Uma contradição que manteve a democracia representativa atrelada aos interesses escusos nacionais e internacionais e que hoje se encontra praticamente falida.

Penso que o que sobrar desse golpe sairá muito mais fortalecido, tanto para a direita como para a esquerda. A direita que não tinha lastro agora tem e deem graças à mídia partidária e de classe que fez a cabeça de grande parte da população, além do que formaram alguns militantes, que é uma coisa nova no cenário político brasileiro. A dança dos verdes-amarelos consistiu num ponto de partida de pertencimento ideológico dessa linha de pensamento, que tem como grandes instrumentos o deus mercado, a meritocracia e o acúmulo de capital. A direita vive no Brasil sua lua de mel com o poder econômico.

Por outro lado, a esquerda brasileira tem a grande oportunidade de se reinventar, de criar a tão sonhada frente de esquerda, a partir de um projeto unificado de sociedade, organizar a sociedade na luta de seus direitos, além de retomar antigas bandeiras históricas perdidas no individualismo de cada segmento e de cada linha de pensamento.

Para hoje no processo de enfrentamento, a grande tarefa será a organização nacional de comitês de resistência suprapartidários, ou ainda de Conselhos Populares, com base na capacitação, principalmente para que se possibilite o nascimento de novas lideranças, que é a grande escassez do momento.

Conquistas se fazem conquistando. Lutas concretas necessitam de exercício diário e contínuo e projeto de vida necessita de sonhos que o alimente.

Cada vez que o trem da história faz uma curva caem por terra centenas de falsos líderes e dão espaço para que, da base da sociedade, sujam novos atores que lutam por uma causa.
Ter uma causa é antes de tudo se comprometer com milhares de pessoas que perderam suas identidades, resgatando seus sonhos perdidos e alimentando o direito de participação como grande instrumento de vida.

Que consigamos embarcar no trem da história e fazermos a travessia rumo a uma sociedade justa, livre e igual para todos e todas.
Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Estatístico e Pesquisador em Gestão Pública e Social
tonicordeiro1608@gmail.com

2 comentários:

  1. Que identidade? Se como povo nem conhecemos nossa história, nem nos importamos em saber a verdade e reafirmamos como verossímil as informações televisivas, ora recebidas e acaloradamente defendidas - no mais profundo e obscuro ignorantismo intelectual.

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