Há uma visão de mundo que vamos construindo a partir das
nossas vivências, nutridas por valores momentâneos ou princípios construídos ao
longo da vida com as nossas crenças, pensamento crítico ou posições
ideológicas. Quem não sabe ouvir, não sabe dialogar. Apenas impõe sua forma de
pensar e agir.
Inicio a caminhada por um tema tão complexo, expondo minhas
inquietudes ao imaginar a base de um mandato, seja de que cargo for, de um
partido ou mesmo da sociedade como “massa”, pois na minha estreita visão isso
tanto caracteriza estes setores da sociedade como algo que pode ser usado para
qualquer fim, dar sustentação ao que vem
de cima da base na pirâmide social ou ainda nos distancia de apostarmos em
formação e organização como métodos para uma possível mudança de sociedade e de
valores.
Enquanto a formação liberta e a organização mostra os
caminhos de enfrentamento, o senso comum de massas aliena, aprisiona e torna grande
parte da sociedade em presa fácil para qualquer situação.
Ao falar de “massas”, como comportamento ou como um
fenômeno humano poderia caminhar por várias linhas de estudo e análise, desde a
Psicologia das Multidões de Gustave Le Bon, à Teoria de Freud do Comportamento de
Massas, que afirma que quando uma pessoa se torna parte de uma multidão, sua
mente inconsciente é liberta e entre outras variáveis de comportamento ele
tende a seguir o líder carismático da massa.
Le Bon compreendia que a psicologia da multidão era
necessária para uma compreensão adequada da história e da natureza humana,
quando afirma:
Em certas horas da história, meia dúzia de homens pode constituir uma
multidão psicológica, ao passo que centenas de indivíduos reunidos
acidentalmente podem não constituí-la. Por outro lado, um povo inteiro, sem que
haja aglomeração visível, às vezes torna-se multidão sobre ação desta ou
daquela influência. (GUSTAVE LE BON, p. 30).
Porém, no sentido de buscar sustentação para minhas
inquietudes, usarei o conceito de dois autores da comunicação, que conceituam “massa”:
Massa:
grande grupo de indivíduos compreendido sempre pela base do menor coeficiente
de organização, interação, produção enunciativa consciente e coesão possível,
ou seja, pela menor quantidade de pontos comuns identificáveis entre os
indivíduos do grupo, o que confere ao “objeto” representado pelo termo um
caráter indistinto, uma falta de clareza que acaba sendo sua principal
característica. (VILALBA, 2006, p. 119).
Massa.
O termo descreve um vasto, mas amorfo conjunto de indivíduos com comportamentos
semelhantes, sob influência externa, e que são vistos pelos seus possíveis
manipuladores como desprovidos de identidade própria, formas de organização ou
de poder, autonomia, integridade ou determinação pessoal. Representa uma visão
da audiência dos media [sic]. (MCQUAIL, 2003, p.506).
Ao caracterizarmos, aceitarmos ou concordarmos de que é
necessário um coletivo de massas para tocarmos o projeto que defendemos,
comungamos dos mesmos ideais do pensamento estratégico da direita de que o povo
só serve para cumprir determinados ritos ou tarefas pré-determinadas e servir a
quem mais lhe seduziu.
Além disso, pensando estrategicamente no processo
eleitoral, cabe uma pergunta: você que será candidato ou candidata a um cargo
público, tem base eleitoral organizada ou apenas eleitores e eleitoras? Dessa
resposta podemos concluir quem é representante de um projeto coletivo desenvolvido
a várias mãos ou da velha forma falida de representatividade, onde não importa
que acordo foi feito ou com quem anda, pois o importante é a vitória eleitoral.
Precisamos ter a coragem de romper com mais essa
engenharia do sistema, que interfere diretamente no processo de mudança da sociedade
que temos para a sociedade queremos, intervindo nos setores caracterizados como
“massas”, oferecendo formação com base na realidade local, ajudando no processo
de organização coletiva e escolhendo alguém para votar que respeite o projeto
construído a várias mãos ou que saia dele e não em alguém que se acha tão
importante e sabido ou sabida, a ponto de se considerar insubstituível.
Caso o que escrevo faça sentido para você, bem vindo e
bem vinda à desconstrução das massas de manobras e a construção de novos
arranjos coletivos rumo a uma sociedade justa, fraterna e igual para todos e
todas.
Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
tEstatístico e pesquisador em Gestão Social
Referências
FREIRE,
Paulo. Pedagogia da autonomia:
saberes necessários à prática educativa. 50. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
2000. 165 p.
LE
BOM, Gustave. Psicologia das Multidões. Tradução de Ivone Moura Delraux. Título
original PSYCHOLOGIE DES FOULES © Presses Universitaires de France, 1895 ©
Edições Roger Delraux, 198O, para a língua portuguesa. Disponível em: https://filosoficabiblioteca.files.wordpress.com/2016/03/le-bon-gustave-psicologia-das-multidc3b5es.pdf.
Acesso em 17 de junho de 2021.
MCQUAIL, D. Teoria da Comunicação de
Massas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003.
VILALBA, R. Teoria da Comunicação:
conceitos básicos. São Paulo: Ática, 2006.
Pior que não se trata só de alienação das massas por pensamentos ideológicos, mas, ultimamente com um auxílio bastante poderoso: proliferação de fake News!
ResponderExcluirMentiras contadas inúmeras vezes até se tornar quase real, se misturam com a realidade até ninguém mais dar bola de saber se é verdade ou mentira…
Essa praga é talvez a maior invenção para alienação e controle das massas… 🥺
Olá companheira Arlete.
ResponderExcluirDe fato vivemos momentos que eu jamais imaginaria que vivêssemos.
O que temos é a resistência para combatermos esse reino do mal.
Grato pela leitura e pelo comentário.
Conteúdo que expressa mais uma vez o quanto precisamos nos organizar enquanto massa pensante e consciente. Resistência é fundamental e ela se dá nos processos formativos e organizativos da base, da comunidade,
ResponderExcluirE de tomada de consciência do quanto há necessidade da derrubada deste poder corrompido antidemocrático.
ResponderExcluirEstou sem palavras, principalmente por conhecer indivíduos que têm tanta vontade de achar que sabem de algo que só eles sabem, que fazem parte dessa massa que confunde bom senso com senso comum. E assim condenamos milhares de pessoas a uma vida miserável
ResponderExcluirO Toni conseguiu abrir uma janela iluminada sobre um tema que é tão intrincado pra muita gente. Gente simples e gente de teorias sobrando pra todo lado.
ResponderExcluirAo fim do texto, a gente fica como uma criança que descobre um bom professor, qdo ela já não sabia mais o que fazer com tantas indagações.
Ficou um gosto de quero mais, na descoberta do quanto ainda é preciso aprender, e reconstruir!
Toni, parabéns!! Excelente artigo.
ResponderExcluirIsso é humilhante:
"Ao caracterizarmos, aceitarmos ou concordarmos de que é necessário um coletivo de massas para tocarmos o projeto que defendemos, comungamos dos mesmos ideais do pensamento estratégico da direita de que o povo só serve para cumprir determinados ritos ou tarefas pré-determinadas e servir a quem mais lhe seduziu."
A massa se humilha diante da burguesia, pois essa nos trata inferiormente.
Precisamos de uma conscientização coletiva para que a massa não se deixe humilhar.
O preconceito, o machismo, a homofobia, o racismo, a tortura, são formas de humilhação.
O presidente Lula é uma pessoa maravilhosa que se coloca no mesmo patamar das pessoas.
Ele não tem complexo de vira-lata. Nem nós.
Se eu fosse uma escrava no século XlX, acredito que não aceitaria a escravidão. Seria uma escrava fujona. E não teria medo de morrer chicoteada no tronco.
Muito grato por você ter complementado o conteúdo através de seus comentarios.
ResponderExcluirAbraço