Como
um saudosista, que acumula erros e acertos na vida, poderia
simplesmente afirmar que já não se pipa como antigamente, visto que
os tempos e os valores são outros e principalmente as pipas já não
são mais as mesmas, pois vêm agora em novo estilo. Porém, é bom
que se diga, que se o amor pelo ato de pipar for o mesmo, não há
tempo, espaço ou lembranças pelo que não deu certo quando
pipávamos no passado, que confundam a cabeça e o coração de quem
enxerga numa pipa a continuidade do desejo pessoal de voar rumo ao
infinito de nossas emoções e realizações.
No
universo do ato pipar, o espírito de liberdade aflora quando sente
que há uma perfeita sinergia entre um ser com uma pipa na mão, o
clima necessário para fazê-la subir, o tempo de construção da
relação de identidade e a pipa no ar, que vai desafiando o universo
em busca da linha do horizonte.
Ontem
eu sonhei pipando e acordei com uma vontade imensa de fazer isso de
verdade e logo hoje que amanheceu um céu lindo e um sol de encher os
olhos de quem não gosta de dias nublados.
Observando
os dias de hoje, é possível afirmar que pipar está fora de moda?
Ou só pipa quem é apaixonado pelo ato de viver e usa o ato de pipar
para colorir o universo? Dá para pipar sozinho? Que graça tem nisso?
Seja como for, pipar rompeu o tempo passado chegando ao presente,
mesmo que de forma tímida diante de tantas brincadeiras tecnológicas
à disposição de quem pipava, porém ainda se mantém vivo e com
energia suficiente para seguir futuro afora, com as rabiolas
desembaraçadas, sem cerol nas linhas e desafiando a lógica de que
só se pipa em dias ensolarados.
Pipar
com classe e com estilo exige planejamento para a elaboração de uma
ação presente, que é a construção da pipa e para uma ação
futura que é pô-la no ar, entendendo o futuro como qualquer segundo
depois do agora, até o infinito de nossas existências ou enquanto
vida tivermos. Essa necessidade organizativa só existe para quem já
tomou a decisão de pipar, fazendo planos no presente em busca do
melhor futuro que vier e criando perspectivas para que essa gostosa
brincadeira possa ter o melhor resultado possível, sempre tendo em
mente o respeito e o carinho por quem estiver junto pipando e o amor
incondicional pelo ato de pipar.
A
decisão de escrever mais uma vez sobre esse tema veio pelo simples
fato das pipas continuarem no ar, desafiando as adversidades e as
histórias mal ou bem resolvidas de quem pipa. Algo que exige
atenção, carinho e muita dedicação para mantê-las sempre lá,
sobretudo paciência, pois se o vento estiver contra não há como
fazer subir uma pipa ou fazê-la permanecer no ar.
Diante
do exposto, vem uma importante pergunta: o que é pipar? Ao buscar
uma resposta sensata, estaremos indo de encontro ao mundo físico
onde pipa, linha e carretel formam os ingredientes necessários,
porém junte-se a isso o prazer, os desafios constantes, a imaginação
que voa junto e os desejos de realizações contidos quando se pipa.
Pipar é arte, é fantasia, é uma doce brincadeira, é ação
concreta e junto com isso a busca incontida de que tudo seja como um
dia viemos a sonhar.
Uma
séria brincadeira que nos leva em imaginação muito mais longe do
que nossas limitações alcançam e impõem. Pipar não é apenas o
evento de soltar pipas, mas um conjunto de fatores que nos levam ao
exercício de pipar, onde um amplo conhecimento do ambiente se torna
essencial.
Pipar
para algumas pessoas é apenas um eterno passatempo, ou mais uma
brincadeira em busca de prazer, mas pensando bem, pipar exige de cada
pessoa que nela esteja envolvida, atenção, carinho, apego, coragem
pelos desafios, determinação em busca de seus objetivos e
principalmente saber onde se quer chegar pipando. Pipar não é
competição de ganha ou perde, mas um ato de pura beleza e leveza,
onde quem estiver envolvido sacie sua vontade, mas esteja preparado
para o próximo ato.
Tem
vezes que o vento não ajuda ou chega uma ventania indesejada. Em outras as
rabiolas embolam e ainda em outras chega alguém e leva nossa pipa
embora. Porém, quando menos se espera algo de extraordinário
acontece. Parece até que a natureza conspira para que tudo ocorra em
perfeita sintonia entre quem quer pipar, o ar, o sol e principalmente
o firmamento que dá um colorido especial com as pipas, lado a lado
riscando o céu.
Lembro-me
bem que já fazia muito tempo que eu não pipava e num daqueles dias
de pura distração dei de cara com uma linda pipa que caiu ao meu
lado e não tive dúvidas em levar aquela joia rara para o meu
universo. Alguns ventos e ventanias após, uma noite estrelada e um
longo sonho, tomei a decisão de que na manhã seguinte, caso
estivesse sol, eu após anos, voltaria a pipar. E assim foi...
O
que mantém as pipas no ar é a magia do momento. É um clima bom e um
vento favorável. É o amor pelo ato de pipar, além da disposição
e vontade de quem pipa, de querer continuar com essa gostosa
brincadeira, pulando os obstáculos, vencendo os desafios e
enfrentando as adversidades que possam ocorrer, principalmente a
partir da crença de que o melhor clima e horizonte para as pipas
continuarem no ar, ainda estão por vir.
Que
a minha vontade de pipar nunca cesse, pois ela é a certeza de que
existe dentro de mim um coração que pulsa acelerado só de lembrar
que sempre é tempo de uma gostosa brincadeira que nos faça lembrar
que a vida segue e que podemos aproveitá-la brincando só pelo
prazer de viver.
Antonio
Lopes Cordeiro (Toni)
Estatístico
e Pesquisador em Gestão Social
Em tempos de tantas intolerâncias, li seu texto e me remeti imediatamente à música:
ResponderExcluir"Vento, ventania, me leve para as bordas do céu
Eu vou puxar as barbas de Deus
Vento, ventania, me leve para onde nasce a chuva
Pra lá de onde o vento faz a curva
Me deixe cavalgar nos seus desatinos
Nas revoadas, redemoinhos
Vento, ventania, me leve sem destino
Quero juntar-me a você e carregar os balões pro mar
Quero enrolar as pipas nos fios
Mandar meus beijos pelo ar
Vento, ventania,
Me leve pra qualquer lugar
Me leve para qualquer canto do mundo
Ásia, Europa, América
Vento, ventania, me leve para as bordas do céu
Pois vou puxar as barbas de Deus
Vento, ventania, me leve para os quatro cantos do mundo
Me leve pra qualquer lugar
Me deixe cavalgar nos seus desatinos
Nas revoadas, redemoinhos
Vento, ventania, me leve sem destino
Quero mover as pás dos moinhos
E…"
Olá Nivea
ResponderExcluirA música deu um colorido especial na proposta de resgate dessa gostosa brincadeira, que anda fora de moda.
Obrigado pela leitura e comentário.