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terça-feira, 25 de março de 2014

Franca uma cidade sem governo

Franca é uma cidade que - desde pequeno - sempre tive carinho e que em muito me desperta atenção. Principalmente pelas pessoas hospitaleiras, clima ameno e dinamismo. A cidade é economicamente estratégica devido seu pólo calçadista. É referência em diferentes aspectos.
De um tempo para cá tenho procurado compreender melhor o dinamismo da cidade, suas relações políticas, de governo e as demandas da população. Do ponto-de-vista analítico tem sido um enorme laboratório. Entretanto, referente ao humanismo: a experiência é de lamento, choque, sentimento de impotência. Já li em muitos livros sobre a barbárie que pode chegar o ser humano em condições extremamente precárias. Quando este sente que não tem mais vez e nem voz. Nem mesmo o necessário.
O conceito de anarquismo é o fim do Estado. Ou seja, a sociedade que se "regulamenta" por si só. E é exatamente a situação que Franca vive e enfrenta hoje. Um (des)governo ausente. Mas não ausente apenas por não fazer. E sim uma ausência que destrói, preocupa e vitimiza. Não são casos pontuais. É uma sequência de erros. São pessoas nas filas dos hospitais com mau atendimento, um número desumano de óbitos na pasta da saúde com famílias enlutadas. É a relação enrijecida e esgotada com a ACIF - Associação do Comércio e Indústria de Franca: com um contato que amplia gargalos ao invés de pensar alternativas conjuntas. São servidores (pais de família, trabalhadores, mulheres lutadoras) sendo tratados com desrespeito e nenhuma valorização.

Quando embolam tantas crises ao mesmo tempo se estabelece um caos. A população perde direção. O resultado é o cidadão contra o servidor e vice-versa. Perde-se o controle e os limites. O vídeo deste blog (segue) me faz refletir mais e mais sobre a cidade, gestão pública com eficiência/efetividade e, principalmente, muita valorização e compromisso com as pessoas. Resumindo, é somente para isto que deve servir a política: focar e valorizar as pessoas. O resto é o que vemos acontecendo por aí: irresponsabilidade, inconsequência e muita dor. No fundo, quem verdadeiramente sabe é quem sente. 
No link abaixo o Programa Alerta Geral registra um “quebra pau” no Pronto Socorro.
Bruno Santana
Ativista, Militante e Colaborador Político e Social
brunolsantana@yahoo.com.br

segunda-feira, 24 de março de 2014

BRASA DORMIDA

Entre um gole e outro de café, na livraria do shopping nesta tarde de domingo, ouvia eu, sem ter interesse nem como evitar, comentários de um ruidoso grupo que ocupava duas mesas ao meu lado. Eram homens e mulheres idosos cobertos por respeitáveis cãs. Uma delas, mais falante, dizia que, quando se formara professora, 51 anos atrás, alguém com autoridade desafiara sua turma de formandos a recuperar os “25 anos de atraso da educação brasileira”. Outro fez as contas e concluiu: “então, já são mais de 75 anos de atraso”!

Não preciso dizer que, a essa altura, minha audição aguçou-se e meu interesse concentrou-se naquela animada tertúlia. Um dia depois da frustrada “Marcha da Família”, à qual nem Deus se dignou a comparecer, parece-me natural minha curiosidade. E a primeira pérola foi lançada no mesmo instante: “o PT acabou com a educação no país”.

Nessas horas, em que casualmente ouço opiniões desse jaez, o sangue ferve e fico sem saber o que fazer. O desejo é de me intrometer e, com a paciência costumeira, chamar os interlocutores ao raciocínio. Mas não posso, bem sei. Em qualquer situação, seria deselegante e um atrevimento que não seria bem recebido pela companhia.

Minha reação foi deixar o lugar. Levantei-me e fui ao caixa, pagar a conta. Deixei o café comentando em voz alta, mas sem qualquer pretensão de que os alegres avós me ouvissem: “o PSDB governa São Paulo há vinte anos e a culpa é do PT!”? A vontade era de, com educação, perguntar qual a lógica desse discurso. Se o ensino no Brasil tem um atraso de 75 anos, como é que o PT pode ser responsável por isso? E, ao mesmo tempo, informar ao grupo que a educação é de responsabilidade dos estados – no nosso caso, de um governo instalado há duas décadas! O dobro do tempo que o PT governa o Brasil.

A uns passos dali, minha esposa me contou outra pérola que ouvira enquanto eu acertava a conta: “o PT despertou o ódio de classe”, dissera a mesma senhorinha falastrona.

Irracionalidade à parte ocorreu-me o seguinte pensamento: essa coisa de o PT ter “despertado” o “ódio de classe” começa a me soar como uma observação verdadeira. Não, obviamente, como uma decisão proposital, consciente, mas como mero – e, quiçá, inevitável – resultado.

De fato, até a ascensão do partido ao poder, o miserável brasileiro repousava como brasa adormecida na fogueira social. Eles lá, aquietados no fundo da senzala, enquanto a minoria refestelava-se tranquila em confortáveis poltronas da casa grande. Vivia-se a paz dos cemitérios.

Lula soprou o braseiro. Levou à gente humilde alimento para matar-lhe a fome três vezes ao dia, esperança e confiança em que poderia conquistar bem mais que o pão nosso diário. Deu-lhe o peixe, mas também forneceu a vara, o anzol, a isca e lições de como pescar, tarefa que vem sendo complementada por Dilma. Ambos deram aos pobres de Cristo oportunidade de ocupar e usufruir dos recursos, públicos e privados, aos quais antes nem sonhavam ter acesso, como shoppings, bancos, aeroportos, planos de saúde, escolas e universidades públicas.

Como formigas alvoroçadas, a plebe passou a incomodar a nobreza, que se achava a salvo do formigueiro e que, de uma hora para outra, viu ameaçados seus privilégios.

Sem se dar conta, Lula e Dilma sopraram também a brasa dormida do sentimento que os da classe de cima sempre nutriram em relação aos negros e brancos habitantes da senzala. Nesse ponto, a velhinha de sóbrias cãs, fulgurantes olhos claros e pele alva tem lá sua razão, sobretudo em relação a si mesma.


Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de Americana/SP
laalbiero@yahoo.com.br

quarta-feira, 19 de março de 2014

A Marcha-à-Ré

Eu não tenho a menor preocupação com a tal Marcha que os extremistas estão prestes a promover, uma verdadeira marcha-a-ré na História do país, clamando pela “volta dos militares”. Mais uma vez se realizará a profecia de Karl Marx, para quem toda tragédia se repete como farsa. Será um espetáculo, no mínimo, cômico, tão ridículo como são os argumentos dos que defendem tal ignomínia.

Mas o tal evento abre oportunidade para, pelo menos, ampliar-se o debate na sociedade brasileira sobre o conceito de Política e, ao mesmo tempo, permite medir a que nível conseguem descer os que não são capazes de derrotar no voto o partido governista.

Travei recentemente um proveitoso debate particular com um conterrâneo, que dizia que os “marchistas” (não confundir com os “marxistas”, desafetos daqueles) não querem ditadura, nem o poder do Estado, nem mesmo um regime militar. Ele tentou explicar esse paradoxo, dizendo que “estamos suplicando aos militares que assumam o governo deste país justamente pelo que os políticos apresentaram nos últimos vinte anos”, ou seja, segundo ele, “enriquecimento ilícito pessoal com o nosso dinheiro”. E acrescentou que “todos os políticos são corruptos, nenhum presta”.

Então, é isso. Na base do discurso, o velho falso moralismo dos que se dizem incomodados com a “corrupção” vendida diariamente pela mídia, embora, desde o episódio do mensalão, em 2005 – em si mesmo, uma mal engendrada mentira –, não se tenha tido nenhuma notícia séria sobre o tema no âmbito do governo federal, alvo preferencial dos “marchistas”. E que nada dizem sobre sonegação – que por certo é prática corrente de muitos desses que se articulam em favor do golpe – e sequer enxergam corrupção em outras esferas de governo, como a robusta propina comprovadamente paga pelas multinacionais Siemens e Alstom a tucanos de alta plumagem que governam São Paulo.

Meu contendor dizia esperar que, com os militares no poder (provisoriamente, se bem entendi), seriam presos todos os políticos corruptos. Fui um tanto deselegante, ao fazer troça dessa ideia. Como é que os militares definiriam quais políticos são corruptos e quais não são? Poderes divinais? 

A partir da prisão em massa de todos os políticos – sim, porque todos são corruptos e nenhum presta – os “fichas limpas” poderiam concorrer aos cargos eletivos. Sugeri, então, que os novos “políticos” tivessem outra designação, como “marcianos”, “venusianos” ou “veganos”. Uai! Mas, afinal de contas, precisamos mesmo de uma intervenção militar para realizar algo que já existe? – objetei.

Disse a ele: “não sei se o decepciono, mas, por esse justíssimo critério, a atual presidenta, os ex-presidentes vivos - todos! Inclusive Collor e Sarney - são fichas limpas e têm totais condições de concorrer ao pleito. Como são fichas limpas (para meu desgosto, digo agora) José Serra, Alckmin, Eduardo Campos, Marina Silva, Joaquim Barbosa... Salvo engano, só Aécio Neves responde a processos por improbidade, mas parece que ainda não houve condenação por órgão colegiado, de modo que até ele deve ser ficha limpa”.

Lembrei ao meu amigo que o país já possui instituições sólidas de controle, fiscalização e punição a atos de corrupção em pleno funcionamento, como CGU, TCU, MPF, PF, Câmara dos Deputados, Senado Federal, controladorias internas nos estados e municípios, MP estaduais, polícias estaduais, TCE’s, assembleias legislativas, câmaras municipais. A par desses, há as organizações da própria sociedade, que deve se manter sempre ativa, participativa e vigilante. Mas o meu amigo diz não acreditar no funcionamento das instituições – e a culpa, obviamente, é do governo federal; e a saída, naturalmente, é um golpe de estado.

Ele insistiu em dizer que “a roubalheira é cada vez maior”, regurgitando essa comida estragada que servem diariamente os telejornais, rádios, jornais e revistas.

Sobre a ideia de que os militares tomariam o poder apenas para convocar eleições, escrevi: “mas ora veja! As eleições já estão convocadas! Serão daqui a apenas sete meses! E a ela, rigorosamente, só poderão concorrer os políticos fichas limpas. Por que incomodar desnecessariamente nossos bravos soldados?”.

Ele descrê da urna eletrônica, de modo que a intervenção serviria também para voltarmos à votação manual – mais uma marcha-a-ré. Argumentei que o PT vem amargando sucessivas derrotas eleitorais no estado de São Paulo, lá se vão vinte anos do tucanato, e nem por isso sai por aí alegando fraude nas urnas eletrônicas. Da mesma maneira, o PSDB já perdeu três eleições presidenciais para o PT e, igualmente, jamais vi alguma liderança tucana queixar-se de tal fraude. Nem o PSOL, sempre irrequieto, jamais acusou de fraudulentos os resultados que lhe garantiram bancadas minúsculas nas recentes eleições.

Lembrei o exemplo de minha própria cidade, de minha própria candidatura a prefeito, em 2004, quando fui derrotado. Outros concorrentes chegaram a me procurar para adotarmos uma atitude em conjunto, porque, ao ver deles, era “evidente” que teria havido fraude em favor do eleito. Não embarquei nessa e os demovi da ideia. 

Nas eleições seguintes, em 2008, o eleito teve dois terços dos votos válidos e não faltou gente séria que, usando dados estatísticos e matemáticos, alardeava que só poderia ter havido fraude. Nas últimas, em 2012, o prefeito, então candidato à reeleição – portanto, no exercício do cargo, dotado de maior poder e, presumivelmente, de mais recursos – foi derrotado pelo atual, que teve os mesmos 2/3 de votos que seu concorrente havia obtido nas anteriores. O que fizeram os críticos de antanho? Nada. Silenciaram, simplesmente. 

Será que quem detinha a fórmula da fraude perdeu-a? Ou, subitamente, deixou de querer vencer eleições? Será que as lideranças do PT, do PSDB, do PSOL e dos demais partidos, que vencem aqui e perdem ali, vencem hoje e perdem amanhã, são tolos a ponto de aceitar passivamente fraudes assim tão “evidentes”?

Encerrei minha participação no debate dizendo: “Meu caro, só existe uma maneira de resolver isso: no voto. Respeitando nossa Constituição, que prevê que todo poder emana do povo, que o exerce diretamente, na forma da lei, ou por seus representantes, eleitos pelo voto popular. Convido-o, pois, a respeitar a soberania da vontade popular, dos cerca de 150 milhões de brasileiros aptos a votar”.


Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de Americana/SP
laalbiero@yahoo.com.br

quinta-feira, 13 de março de 2014

As verdades e as mentiras que nos leva a pensar


Tem algumas coisas nas nossas vidas que não conseguimos explicar, como por exemplo, um estranho sentimento que passamos a ter quando nos envolvemos de corpo e alma por algo que começamos a gostar e esse gosto, uma vez correspondido, para a ser diário, contínuo e aos poucos começa a incorporar nossas próprias vidas.

Imagino que foi a partir dessa alusão que a tristeza foi inventada, pois alguém triste não tem poder nem de ação e muito menos de reação. A tristeza, por exemplo, de ver alguém ser preso ou assassinado injustamente, ou ser torturado pelos cães do sistema ou ainda de perder alguém ou algo que era de vital importância em suas vidas, deixa o ser humano frágil e uma presa fácil a ser controlada.

É bem provável que tenha sido por isso que inventaram a mentira de que política, religião e futebol não se discutem. Trata-se de três universos altamente subversivos em termos de envolvimento, mesmo que seja pela negação. Será que é a sedução implícita em cada um deles e que faz com que as pessoas simplesmente se apaixonem, que os tornou indecifrável para quem controla o poder? Por certo foi, é e ainda será.

Certa vez quando minha filha era bem pequena, numa caminhada pelo bairro onde morávamos e andávamos de mãos dadas, passeando com uma cachorra que tínhamos, algo inesperado ocorreu. De repente minha filha me surpreende ao perguntar: “Pai o que é política”? Logo eu que adora falar sobre aquilo, a meu ver com muita propriedade, fiquei por alguns segundos sem palavras. Simplesmente não sabia como lhe explicar que tudo que a vida nos oferece e tudo que fazemos vêm ou é da política.

Por alguns minutos estava eu ali diante dela tentando alinhavar um vocabulário que ela pudesse entender, além de desenhar um enredo que chegasse o mais próximo possível do que imaginava ser razoável, para responder a uma criança interessada de mais ou menos oito anos de idade o que é política. Um dos medos era o de não responder nem mentiras que a fizesse se afastar e nem determinadas verdades, que só o tempo se encarrega em fazer com que possamos entender na medida em quem escolhemos um caminho para seguir.

Fiquei alguns minutos dando exemplos, contando casos e procurando o melhor momento para fazer a pergunta conclusiva: entendeu? E quando tomei coragem de fazer, ela na pura ingenuidade, porém com muita convicção me respondeu: pai eu não entendi nada. E eu abraçando-a simplesmente lhe falei: “Fica tranquila. O tempo se encarregará em te fazer entender”. E continuamos a caminhar.

Essa é uma cena que não tem idade para ocorrer, pois se a maioria da população esteve sempre ausente dessa discussão, principalmente pelo fato de acreditar que se trata de algo ruim como a velha mídia passa, a partir dos infinitos editoriais e da teoria da conspiração é de se imaginar o porquê que a maioria das pessoas não nutre nenhum interesse nem pela política e tampouco por qualquer coisa que dela venha, como por exemplo, as Políticas Públicas. Isso ocorre justamente para que os mesmos vilões da história, governem e possam deixar seus sucessores, ocupando o espaço para que alguém que defenda os interesses da população excluída não tenha vez nem voto.

A velha mídia, principalmente a composta pelos veículos de comunicação daquelas seis famílias, que sozinhas dominam 70% de toda a imprensa, transformou-se na atualidade, sem sombra de dúvidas no quarto poder, em algo que quer determinar quem somos, o que fazemos e principalmente no que podemos pensar e isso não ocorreu por acaso. Há uma rede de interesses por trás que nutre diariamente com informações e conspirações, a começar por grande parte da academia, que para servir ao sistema e às seis famílias, mantém um sistema de ensino desatualizado e o pior, comprometido em combater tudo e todos que coloquem em risco a hegemonia daquelas famílias, da elite brasileira e principalmente do sistema. São fabricadores dos "cozinhas" da atualidade.

Por onde anda o bom senso? Por onde deve andar a verdadeira justiça? Será que ela já existiu em algum momento da história? O que é verdade e o que mentira para quem não participa do processo e age como máquina processadora de informações?

Nem que ficássemos dias, não conseguiríamos dar cabo de tantos assuntos, simplesmente pelo fato de que por trás de cada resposta existe um processo cultural e ideológico, que remete ao que vemos hoje, principalmente nas redes sociais, porém com um link no passado.

É importante entendermos que cada provocação tem uma fonte e cada conspiração também. Bom mesmo é quando sabemos de quem se trata e se é de uma fonte segura, mesmo sendo da oposição, pois assim podemos nos contrapor livremente e defender o que acreditamos ser  uma sociedade do futuro: uma sociedade justa, fraterna e igual para todos e todas.

Apenas algo me arrisco a afirmar: no passado tínhamos uma sociedade menos violenta do que a de hoje e porque não dizer mais interessada. Não que a luta do bem conta o mal seja algo novo, pois sempre existiu e não vai acabar tão cedo, pois se nutre nas entrelinhas da teoria da conspiração, mas a sociedade da informação ou como a direita que chamar da sociedade de resultados, não tem alma e muito menos tempo para resolver os conflitos que leve tempo para solucionar. Assim, a paz, que devia ser para todos e todas, se torna algo como uma moeda de troca, desde que o indivíduo esteja alinhado e disponível para o sistema.

Não estou pessimista e sem um tanto realista e é por isso que luto tanto para levar uma mensagem positiva por onde ando.

Qual a solução para esse impasse que vivemos? Amar mais, ser mais tolerante, aprender a ouvir mais do que falar, brigar apenas pelo que achamos justo e, sobretudo participar, pois a participação nos oferece as verdades e as mentiras, a partir do nosso ponto de vista e isso possibilita determinarmos, com mais segurança, quem elegemos como nosso representante, seja em que espaço político for.

Duas frases para reflexão:

“Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência”. (Karl Marx)

“Poder é toda chance, seja ela qual for, de impor a própria vontade numa relação social, mesmo contra a relutância dos outros”. (Max Weber)

Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Coordenador do Programa de Capacitação Continuada
em Gestão e Políticas Públicas da Fundação Perseu Abramo
toni.cordeiro1608@gmail.com

terça-feira, 11 de março de 2014

A quem interessa um golpe na democracia?

Tortura Nunca Mais!

Quero iniciar essa conversa afirmando que um golpe não necessariamente é o que já foi. Ou seja, militares nas ruas, direitos políticos cassados, beatas marchando e entregando freiras e padres progressistas à tortura e à morte, milhares assassinados e torturados, a imprensa golpista em êxtase e as empresas bancando financeiramente as armas, a tortura e toda sacanagem. Um golpe pode ser uma ação de traição, por exemplo, uma série de notícias para confundir a cabeça do povo, um partido ou um político que se vende ao sistema econômico global, alguém que vira um corrupto e tantas outras pequenas coisas que vão minando a resistência democrática e que diariamente assistimos. Que tal pegarmos como por exemplo a Ação Penal 470, que foi tratada até o momento como vingança e não como justiça?

Tenho sérias divergências com quem acredita que mais vale fazer pequenas ou grandes sacanagens para manter ou chegar ao poder alguém que consideramos que vai fazer um bom governo ou um bom mandato, do que deixar que alguém que já é sacana de papel passado chegar lá. Por exemplo, a justificativa do chamado “caixa dois” para o financiamento das campanhas milionárias. Que diferença tem? Por acaso os recursos não sairão das mesmas fontes? Não afetarão as mesmas pessoas na sociedade? Que diferença há se vai para o bolso de alguém ou se para os cofres de uma empresa de marketing político?

Isso não quer dizer que se as empresas quiserem financiar uma campanha não seja possível. Não vejo qual é a lógica de uma empresa financiar um partido ou uma pessoa de esquerda, mas até dá para entender. Porém criar esquemas durante uma gestão justamente para isso, além de ser imoral é crime contra a humanidade.

Nos cursos que tenho ministrado de Gestão Pública por várias partes do país, pela Fundação Perseu Abramo, tenho provocado uma ampla discussão com os participantes, a se iniciar pelo papel de cada um na sociedade e também qual é o projeto de vida de cada participante. Creio que tudo começa por um projeto de vida pessoal.

Fico horas pensando o que faz uma pessoa pedir novamente os militares de volta, ou ainda apoiar uma reedição da tal marcha das beatas e direitosas pela liberdade. Que liberdade? Ou ainda pedir um Fora Dilma, mesmo sabendo que as ditaduras militares assassinaram e torturaram milhares de pessoas na América Latina somente por prazer e por poder. Das duas uma: ou se trata de uma pessoa completamente alienada e analfabeta política ou se trata de uma enorme sacana, inimiga de democracia e inimiga do povo brasileiro.

Já afirmei anteriormente que um processo eleitoral, pelo seu teor democrático, tem também como finalidade, fazer com que as pessoas se exponham livremente, mesmo que sejam nazistas. É muito bom que todos os monstros saiam das tocas para sabermos quem é quem. Acabo de excluir algumas delas do meu relacionamento político, social e principalmente das minhas possíveis amizades. Até porque daqui para frente estaremos em lados opostos e projetos completamente diferentes.

Depoimentos de D. Paulo Evaristo Arns em seu livro, transcritos abaixo, expõem a crueldade dos militares envolvidos no processo de tortura, assim como seus informantes, que no seio da sociedade, vendiam a ideia de que estavam junto com a população e com as lideranças políticas, chamados na época pelos militares de “terroristas”. D. Paulo relata ainda como um militar norte-americano ensinava a torturar, em detalhes, usando mendigos, as vezes até a morte.

A tortura foi indiscriminadamente aplicada no Brasil, indiferente a idade, sexo ou situação moral, física e psicológica em que se encontravam as pessoas suspeitas de atividades subversivas. Não se tratava apenas de produzir, no corpo da vítima, uma dor que a fizesse entrar em conflito com o próprio espírito e pronunciar o discurso que, ao favorecer o desempenho do sistema repressivo, significasse sua sentença condenatória. Justificada pela urgência de se obter informações, a tortura visava imprimir à vítima a destruição moral pela ruptura dos limites emocionais que se assentavam sobre relações efetivas de parentesco. Assim crianças foram sacrificadas diante dos pais, mulheres grávidas tiveram seus filhos abortados, esposas sofreram para incriminar seus maridos.

Sob o lema de ‘Segurança e Desenvolvimento’, Médici dá início, em 30 de outubro de 1969, ao governo que representará o período mais absoluto de repressão, violência e supressão das liberdades civis de nossa história republicana. Desenvolve-se um aparato de ‘órgãos de segurança’, com características de poder autônomo, que levará aos cárceres políticos milhares de cidadãos, transformando a tortura e o assassinato numa rotina.

De abuso cometido pelos interrogadores sobre o preso, a tortura no Brasil passou, com o Regime Militar, à condição de “método científico”, incluído em currículos de formação de militares. O ensino deste método de arrancar confissões e informações não era meramente teórico. Era prático, com pessoas realmente torturadas, servindo de cobaias neste macabro aprendizado. Sabe-se que um dos primeiros a introduzir tal pragmatismo no Brasil, foi o policial norte-americano Dan Mitrione, posteriormente transferido para Montevidéu, onde acabou sequestrado e morto. Quando instrutor em Belo Horizonte, nos primeiros anos do Regime Militar, ele utilizou mendigos recolhidos nas ruas para adestrar a política local. Seviciados em sala de aula, aqueles pobres homens permitiam que os alunos aprendessem as várias modalidades de criar no preso a suprema contradição entre o corpo e o espírito, atingindo-lhes os pontos vulneráveis.

Que não venham em nome da moralidade humana, onde toda promiscuidade serve apenas para mantê-los no poder econômico global, rifar a democracia que já custou tantas vidas. Afinal se o povo pobre da América Latina come melhor, mora melhora e trabalha melhor, é graças aos governos populares que estão em vigência e é justamente contra isso que a direita, a extrema direita e o PIG lutam. Ou seja, o fim dessas mordomias para os pobres. Estão inclusive incomodados com o pleno emprego, afirmando que num país como o Brasil, um terço dos empregados tem que serem mandados embora, para novamente se criar o exército industrial de reserva, que servia para intimidar quem estar trabalhando e pedia aumento.

Um golpe na democracia só interessa aos inimigos do povo, aos amigos da pobreza, como é o caso da metade da população mundial, que ainda passa fome, aos inimigos da igualdade de condições e a quem interessa confundir a cabeça daqueles que não participaram do momento de terror no Brasil e tampouco sabem juntar o passado com o presente golpista.

Tenho plena convicção que o povo brasileiro não se intimidará a voltar às ruas, se necessário, contra a corrupção por certo e com toda razão, porém também contra toda bandalheira, como por exemplo, o Propinoduto Tucano dos trens e metrôs de São Paulo, algo que já soma 12 bilhões em propinas, mas jamais em favor de um golpe e sim pela manutenção a qualquer custo da Democracia Brasileira.


Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Coordenador do Programa de Capacitação Continuada
em Gestão e Políticas Públicas da Fundação Perseu Abramo
toni.cordeiro1608@gmail.com

sexta-feira, 7 de março de 2014

Vai ter Copa na bola. E na bala?


Os olhos do mundo já estão voltados ao Brasil. Porque somos uma vigorosa economia que concilia crescimento, geração de emprego, distribuição de renda, soberania e democracia institucional.  E porque vai ter Copa. É fato que sediarmos o cobiçado evento da FIFA não aparecia negativamente – embora já houvesse a luta dos Comitês Populares da Copa – até as chamadas Jornadas de Junho de 2013.

As novas palavras de ordem que invadem as redes, “Não Vai Ter Copa”, carregam diferentes sentidos para diferentes grupos. Ali estão pessimistas incorrigíveis, oposição oportunista, movimentos de moradia (legitimamente indignados com remoções arbitrárias), entre tantos. Contudo, a discussão central nesse momento me parece ser a violenta repressão aos protestos e tentativas de recrudescimento da legislação.

Não é demais recordar que as multidões tomaram as ruas em junho passado exatamente após assistirmos cenas de violência contra os jovens (e transeuntes, fotógrafos, jornalistas) por parte da Polícia Militar do Estado de São Paulo. A imagem da jornalista de um grande jornal atingida por bala de borracha chocou o país. É verdade que as noites na periferia de São Paulo são ainda mais sangrentas, mas a exposição pública do uso desproporcional da força catalisou aquela onda de protestos.

Passará a Copa, junho, surgirão novas demandas e a dúvida que fica é qual será o legado disso tudo no campo das liberdades democráticas. A proposta de legislação antiterrorista é erro grave. Erro grave porque não se deve tratar questão social – concordemos ou não com ela -como questão de polícia e, ao mesmo tempo, o arcabouço legal já existente dá conta de coibir grupos minoritários que usam (lamentavelmente) de violência e depredação do patrimônio. E erro grave porque não traz à baila questões mais profundas como a proibição do uso de balas de borracha contra manifestantes e a desmilitarização das PM´s.

Em 2014, o Brasil ganhará com a Copa e o povo brasileiro não admitirá retrocessos. Mas a falta de habilidade dos governos para solucionar conflitos mostra que ainda temos muito a aprender com as ruas.

Vinícius Ghizini
Historiador e membro da Executiva do PT na Macrorregião de Campinas

vinighizini@yahoo.com.br

terça-feira, 4 de março de 2014

O Cavaleiro das Trevas rasga a fantasia

Os super-heróis de criação norte-americana costumam ocultar sua verdadeira identidade, por óbvias razões de segurança. Super-Homem, nas horas comuns, é Clark Kent; o Homem Aranha nasceu Peter Parker; e sob a máscara de Batman oculta-se o milionário Bruce Wayne, que se fantasia de morcego para defender os fracos e os oprimidos.

No filme “O Cavaleiro das Trevas”, a dupla personalidade leva o Homem Morcego a uma séria crise de identidade, a ponto de, ele mesmo, no final, pedir ao comissário Gordon que a polícia passe a tratá-lo como bandido, auto acusando-se pela morte do promotor Hardey Dent. Gordon aceita, dizendo que Batman é o “herói que Gotham City merece, mas não o que ela precisa agora”.
Nosso ainda presidente do Supremo Tribunal Federal tem sido reiteradamente associado à figura de Batman. Cantam-no como herói desta imensa Gotham tupiniquim. Mas ele, como seu congênere americano, sofre também de dupla personalidade.

Joaquim Barbosa chegou ao Supremo pelas mãos de Lula. O ex-presidente da República precisava indicar um novo ministro para a mais elevada Corte do país e queria dar um exemplo e um passo histórico: nomear o primeiro negro. Para Lula, era preciso dar vigor ao seu trabalho de expandir a representatividade popular nos postos de mando do país, em sua obstinação de empoderar as classes populares, os pobres, os fracos e oprimidos.

Nomeou Barbosa sem atentar para seu passado de agente de confiança durante governo da ditadura militar, subordinado a ninguém menos que o polêmico Golbery do Couto e Silva, de melancólica lembrança. Mas trazia no currículo uma obra, uma única obra jurídica de sua autoria em português (tem outra, acadêmica, em francês), que tem por título “Ação Afirmativa & Princípio Constitucional da Igualdade - O Direito como Instrumento de Transformação Social - A Experiência dos EUA”, lançado pela editora Renovar em 2001, em que defende a aplicação das cotas raciais. Foi a senha para que Lula o escolhesse.

Fico imaginando o conflito de nosso super-herói, antigo servidor dos regimes militares, tendo que dirigir-se ao presidente petista para pleitear a nomeação. Deve ter sido doloroso. 

Quis o destino, como diria Sarney, que o menino pobre de Paracatu viesse a ser o relator do mais polêmico processo penal de que se tem notícia, julgado pelo Supremo. 

Imediatamente, os agentes midiáticos, que outrora houveram condenado sua nomeação ao STF, destacando a truculência contra a própria esposa e questionando seu saber jurídico, transformaram-no em herói nacional, em super-herói, no Batman que mudaria o país, salvando-o da quadrilha que tomara de assalto o governo de Gotham City. Pelo voto popular, é verdade, mas isto é apenas um detalhe.

Na mesma velocidade, o negro outrora pobre alçado ao Supremo no bojo de um projeto político de empoderamento das classes populares, esqueceu-se disso. Deu de ombros à própria origem, aos irmãos de classe e de cor. Ignorou que o partido içado ao governo federal pela legitimidade do voto popular precisava implementar medidas que de fato sedimentassem o caminho de libertação dos miseráveis. E embarcou no discurso fácil do falso-moralismo, indo ao cúmulo de transformar um corriqueiro (mas não menos grave) crime de caixa-dois eleitoral em atos de corrupção. Ativa, é verdade, mas corrupção.

Lula saiu da senzala. Dirceu, Genoino, Delúbio, João Paulo, idem. Apostando na luta institucional, disputando o voto do eleitorado brasileiro, chegaram ao topo da pirâmide governamental sem jamais abrir mão dos valores da própria origem, sem jamais ceder às tentações do poder econômico. Barbosa, ao contrário, assimilou rapidamente os valores da Casa Grande. Deslumbrou-se debaixo dos holofotes, ao ver-se nas capas de jornais e revista e nas telinhas de TV. 

A máscara caiu, porém. Pés de barro, não resistiu à verdade lançada à sua cara lavada pelo ministro Luís Roberto Barroso. Deixou escapar, ao vivo e em rede nacional, um esclarecedor “foi pra isso mesmo”, confessando o artificialismo que usou para condenar os réus, ato falho que na mesma hora percebeu, mas era tarde. A confissão estava feita.

Restou, em seu voto, aliás, em seu discurso “baixa-caixão”, lamentar a “triste tarde” em que parte da farsa da AP470 foi desvendada e sepultada pela maioria do Supremo. O milionário Bruce Wayne foi, enfim, revelado à Nação. Nesse discurso, Barbosa cunhou seu próprio epitáfio, cedendo uma vez mais à vaidade e à soberba, falando de si e de sua obra: “aqui jaz um trabalho primoroso”. Primoroso para a classe que ele optou por representar, dos que detêm o poder econômico no país. À luz da justiça e do Direito, uma merda. 

O Brasil não precisa nem merece um falso herói como Joaquim Barbosa.

Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de Americana/SP
laalbiero@yahoo.com.br

Respondendo ao querido amigo N. F. sobre o que chama de Propaganda Ideológica

Meu querido amigo N. F. de ontem, de hoje e de sempre. Fico feliz que tenha dedicado alguns minutos a este pobre diabo que o incomoda tanto com sua, minha, propaganda ideológica... Não me imaginava digno de tal deferência.

É, meu amigo, você tem toda razão. Difícil é livrar as pessoas da apreensão simplista da realidade, do senso comum ou da fé positivista nos fenômenos. Eu que o diga. Há anos luto contra o simplismo, o senso comum rotulado “mensalão”.
Eis aí o grande exemplo da sua proposição. Basta mencionar a palavra, o rótulo meticulosamente engendrado e repetido ao longo dos anos – nove anos! - para as pessoas assimilarem do que se trata. E toda uma “verdade indiscutível” se constrói no imaginário das pessoas. É - você tem razão, é a força avassaladora da propaganda ideológica.

E não adianta invocar a razão. Não adianta mencionar fatos, ou ausência deles. Não adianta citar provas em contrário, tampouco a ausência de provas de sua existência. As pessoas introjetaram essa “verdade subjacente” – repetindo uma vez mais seu Léfort. Coisa de fazer inveja a Goebbels.

Desculpe-me, não sabia que o incomodava tanto a minha militância – que ontem foi acusada de ser “remunerada”, mas decerto também neste caso pugnar por provas, fontes ou lógica racional não vai adiantar, talvez nem invocar minha história nesse campo. Devo confessar que a massiva propaganda ideológica em contrário, que recebo minuto a minuto no Face, de incontáveis fontes, também me perturba, porque conspurca meu espaço virtual com disseminação de ódio e preconceito e eu não tenho forças, nem disposição para rebater a todas as postagens com conteúdo racista, raivoso, que as pessoas não se pejam de expor.
Perturba-me ver comparações, por exemplo, entre Lula e os presidentes militares, extraindo-se daí a inacreditável conclusão de que os militares seriam “mais éticos” (sic!) ou mais eficazes que nosso estadista maior... Ops! Desculpe-me, chamar Lula de “estadista”, e ainda mais de "maior", a você certamente soará como mais um capítulo de propaganda ideológica. Mas é o que penso e não vou estender este texto ao ponto de repetir tudo o que venho dizendo há tempos. Vou poupar-lhe tempo.

Minha militância, você sabe, começou na adolescência. Desde então, estou acostumado a enfrentar os narizes torcidos, as incompreensões, os rancores, o ódio mesmo dos reacionários da nossa amada Capivari. Por aquela época, um simples distribuir panfletos, nas feiras, de madrugada, ou de porta em porta, sob sol e sob chuva – às vezes produzidos por mim mesmo, com meus próprios recursos, sem patrocínio sequer do partido; uma vez produzidos por você, lembra-se? – já incomodava os que, hoje percebo, advogam a ideia do pensamento único. No grupo “Amigos Capivari”, aqui do Face, do qual me retirei por absoluta incompatibilidade ideológica, porque formado fundamentalmente por gente com esse perfil, com esse tipo de pensamento sufocador do outro, tudo ficou muito mais claro – mas esse é outro assunto.

Ora, se eu militava na juventude com toda aquela dificuldade de meios, não seria agora, cinquentenário e tendo meios muito mais fáceis, eficazes e abrangentes de produção, exposição e alcance que eu iria coibir minha liberdade de pensamento e expressão, não é mesmo?

É você tem razão. É fácil chamar Zé Dirceu de “canalha”, de “mensaleiro” ou qualquer outro rótulo. É fácil dizer que Genoíno é “ladrão”, “corrupto”, embora isso atente até mesmo contra os fatos aos quais se refere quem assim o chama, por absoluta ignorância. É fácil nos chamar, a todos nós petistas, de “quadrilheiros”, “corja” e outras desonras afins. É fácil rotular a partir de impressões pessoais, como as que você diz que nutre por Dirceu desde tempos imemoriais. Lamento informar Vossa Excelência, mas para mal de seus pecados, sua opinião vale tanto quanto a minha. Como prova judicial, não valem nada, nem a sua, nem a minha.
A minha ideologia, meu caro, é só e exatamente o contrário da ideologia que você prega. Nem mais, nem menos.

E nesse jogo de espelhos, que não me arrisco a jogar porque você faz melhor do que eu, é igualmente válido afirmar que toda afirmação de “fatos ou razões explicadas por ‘verdades a priori’ torna-se má-fé ou, na melhor das hipóteses, ignorância”. Assino embaixo.

Palocci nunca foi objeto de minha “propaganda política”, decerto por razões coincidentes com as suas. E espero que, tendo você a inteligência que tem, não imagine que pecados – ou quiçá ilícitos – porventura cometidos por ele (a justiça, a justiça comum, o absolveu de todas as acusações) contaminem todo o partido, ou o governo, ou o projeto que temos para o país. 

O que me preocupa, sempre, é a injustiça. Injustiça com Genoíno, hoje preso apenas porque, como presidente do partido, assinou – porque era sua obrigação assinar – um contrato de empréstimo, legítimo, pago pelo partido e aprovado pela Justiça Eleitoral. Injustiça contra Dirceu, que, apenas por ser Ministro de Estado de um governo malquisto pelos detentores do verdadeiro poder, o econômico – aqueles a quem rotulamos “direita”, “elites” etc., nesse nosso afã incontrolável de rotular a tudo e a todos – foi acusado de chefiar uma “quadrilha”. Uma “quadrilha”, leia-se, que seria o partido ao qual aderi desde a adolescência. Que chegou ao poder e, efetivamente – reconhece-o o mundo todo! – provocou uma revolução social neste país. Bom, mas isto, certamente, é também parte da minha propaganda ideológica, e que ONU, OMS e outros organismos internacionais, instituições de ensino estrangeiras, governos de outros países vão às favas, não é mesmo?

Não, a verdade não me pertence. Mais uma vez, sou obrigado a dar a mão à palmatória e reconhecer que você tem razão. Não pertence nem a mim, nem a você, nem aos que detratam os chamados “mensaleiros”, meu caro, os que os condenaram a priori e agora não aceitam a decisão judicial definitiva, como nunca aceitaram a hipótese de inocência deles.

Nessa área, o que vale é a prova dos autos. Sim, pois falamos de supostos crimes, de processo penal, de condenações que exigem provas. A verdade do juiz é a verdade revelada pelos autos. Se não há provas, não há verdade juridicamente válida.

O julgamento do "mensalão" passará para a história por várias razões. Uma delas, pelo aspecto político. Você deve ter visto Celso de Mello – que serviu a Saulo Ramos, no governo Sarney, pelas mãos de quem chegou ao Supremo - votando, aliás, discursando, vociferando contra o PT, acusando-nos de “tomar de assalto (palavra escolhida a dedo) as estruturas governamentais” e de pretendermo-nos “perpetuar no poder”. Isso lá é discurso jurídico? É voto, juridicamente aceitável? Não, meu caro. Razões políticas não sustentam decisões judiciais. Não podem. Não poderiam... 

Interessante foi ver o esforço dele em repetir expressões como “as provas dos autos...”, os “crimes praticados...”, a “quadrilha ou bando...”, mas sem dedicar uma única palavra a expor quais seriam as “provas” e quais seriam os “crimes” – tecnicamente falando. Um evidente esforço retórico, decerto para tentar convencer-se a si mesmo da presença do que não existe, das “provas” e dos “crimes”, já que, como técnico do direito, Celso costuma ser impecável e digno da minha admiração.

Nem vou falar do Gilmar Mendes, o coronel de Diamantino, ou de Marco Aurélio, da oligarquia alagoana. Nem mesmo de Joaquim Barbosa, que serviu a Golbery nos governos militares, cuja truculência e arbitrariedade ele mesmo não faz a mínima questão de disfarçar.
Mas a ausência absoluta de provas foi detectada por vários outros ministros, tendo a ministra Rosa Weber – e isso eu testemunhei, porque assistia à transmissão ao vivo, da mesma maneira como testemunhei os demais votos a que me referi – ter dito que “não há prova cabal contra Dirceu, mas voto pela condenação porque a literatura me permite”. Ela devia estar-se referindo à literatura policial, de Agatha Christie e Conan Doyle, em cujas obras as soluções são dadas por dedução, por meras ilações...

Outra razão. Esse julgamento será histórico pela atipicidade técnica. Começou com uma denúncia rançosa, de caráter evidentemente político, sem sustentação fática, uma verdadeira “obra de ficção”, como alguém destacou. Não, não estou repetindo o que ouvi, não. Eu a li, digo-o como técnico do direito. Denúncia, você sabe, é a peça jurídica construída pelo Procurador Geral da República, o anterior ao Gurgel, aquela que inicia o processo, propriamente dito. Tão deficiente que foi assim qualificada pelo próprio relator, ele mesmo, Joaquim Barbosa, à época em que este iniciava seus trabalhos, segundo testemunho ontem publicado pelo jornalista Felipe Rocondo (acho que é esse o nome), do suspeitíssimo Estadão... Seguiu com a utilização indevida, inadequada, de uma teoria denominada “domínio dos fatos”, cujo autor, um alemão, ele próprio citou a inadequação ao caso. Só porque era ministro, daí se concluía que Dirceu era o “chefe da quadrilha”... Passou até mesmo pela condenação artificialmente dosada para escapar da prescrição, como relata o mesmo jornalista. Terminou numa “triste tarde” com um discurso do próprio Barbosa, em que este, desmascarado, buscou desqualificar seus próprios pares, inclusive os que votaram com ele, como Celso de Mello e Marco Aurélio, e atingiu os demais poderes, o Executivo e o Legislativo.

Passará para a história também como o maior erro judiciário brasileiro. Aliás, não se trata de erro, propriamente dito, mas dolo. Dolo específico de prejudicar, de perseguir, de condenar representativos dirigentes de um partido que, segundo seus algozes, não poderia ter chegado ao poder e não pode nele permanecer, a ser derrubado custe o que custar. Perseguição que segue até hoje, seja porque os presos em regime semiaberto cumprem as penas, na prática, em regime fechado, seja porque Barbosa empreende a mais insana sequência de atos de sufocação dos presos, já mais do que suficientemente humilhados.

Enfim, tenho outros afazeres urgentes e não quero tomar mais do seu precioso tempo, embora você tenha tido a elegância de me dedicar valiosos instantes do seu para me dirigir sua mensagem (que achei por acaso, você precisa aprender a usar o recurso "marcar", do Face), para me dizer o quanto minha “mialitância ideológica” o incomoda. Não, não vou mais incomodá-lo. Se ainda tiver tempo para mais um texto de minha autoria, que de vez em quando repito aqui, conforme a necessidade, convido-o a lê-lo clicando neste link: 

https://www.facebook.com/notes/luís-antônio-albiero/aos-meus-parentes-amigos-e-conhecidos-da-vida-real/695824653770867 

Você, M. A., G. e todos de sua família são pessoas que admiro e a quem quero muito bem. Não se sintam, pois, desprestigiados por eu os excluir da minha lista de amigos, aqui do Face. É só uma "amizade" (sic) virtual, afinal, que não se confunde com a amizade real. No texto, você compreenderá minhas razões. Faço-o justamente para preservar nossa amizade, real e sem aspas. Fique à vontade para visitar minha página, sempre que desejar.

Quando quiser e sentir saudades venha a Americana. Traga A. Se possível, traga An. também. Serão sempre bem-vindos em minha casa, como sempre foram. No ano que vem, se tudo correr bem e se eu e Luciana conseguirmos realizar nosso velho projeto de construir nossa casa própria, voltaremos a residir aí e nossos encontros haverão de tornar a ser frequentes. Desde que, claro, não tratemos de política. Muito menos de ideologia...

Beijos à A., lembranças ao bom e velho J. e a todos aí. Fiquem em paz.

PS.: a poesia emoldura a realidade, mas esta é obra que se constrói com atos concretos. Decerto, os poetas incomodam menos que os construtores.

Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de American/SP
laalbiero@yahoo.com.br