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terça-feira, 4 de março de 2014

Respondendo ao querido amigo N. F. sobre o que chama de Propaganda Ideológica

Meu querido amigo N. F. de ontem, de hoje e de sempre. Fico feliz que tenha dedicado alguns minutos a este pobre diabo que o incomoda tanto com sua, minha, propaganda ideológica... Não me imaginava digno de tal deferência.

É, meu amigo, você tem toda razão. Difícil é livrar as pessoas da apreensão simplista da realidade, do senso comum ou da fé positivista nos fenômenos. Eu que o diga. Há anos luto contra o simplismo, o senso comum rotulado “mensalão”.
Eis aí o grande exemplo da sua proposição. Basta mencionar a palavra, o rótulo meticulosamente engendrado e repetido ao longo dos anos – nove anos! - para as pessoas assimilarem do que se trata. E toda uma “verdade indiscutível” se constrói no imaginário das pessoas. É - você tem razão, é a força avassaladora da propaganda ideológica.

E não adianta invocar a razão. Não adianta mencionar fatos, ou ausência deles. Não adianta citar provas em contrário, tampouco a ausência de provas de sua existência. As pessoas introjetaram essa “verdade subjacente” – repetindo uma vez mais seu Léfort. Coisa de fazer inveja a Goebbels.

Desculpe-me, não sabia que o incomodava tanto a minha militância – que ontem foi acusada de ser “remunerada”, mas decerto também neste caso pugnar por provas, fontes ou lógica racional não vai adiantar, talvez nem invocar minha história nesse campo. Devo confessar que a massiva propaganda ideológica em contrário, que recebo minuto a minuto no Face, de incontáveis fontes, também me perturba, porque conspurca meu espaço virtual com disseminação de ódio e preconceito e eu não tenho forças, nem disposição para rebater a todas as postagens com conteúdo racista, raivoso, que as pessoas não se pejam de expor.
Perturba-me ver comparações, por exemplo, entre Lula e os presidentes militares, extraindo-se daí a inacreditável conclusão de que os militares seriam “mais éticos” (sic!) ou mais eficazes que nosso estadista maior... Ops! Desculpe-me, chamar Lula de “estadista”, e ainda mais de "maior", a você certamente soará como mais um capítulo de propaganda ideológica. Mas é o que penso e não vou estender este texto ao ponto de repetir tudo o que venho dizendo há tempos. Vou poupar-lhe tempo.

Minha militância, você sabe, começou na adolescência. Desde então, estou acostumado a enfrentar os narizes torcidos, as incompreensões, os rancores, o ódio mesmo dos reacionários da nossa amada Capivari. Por aquela época, um simples distribuir panfletos, nas feiras, de madrugada, ou de porta em porta, sob sol e sob chuva – às vezes produzidos por mim mesmo, com meus próprios recursos, sem patrocínio sequer do partido; uma vez produzidos por você, lembra-se? – já incomodava os que, hoje percebo, advogam a ideia do pensamento único. No grupo “Amigos Capivari”, aqui do Face, do qual me retirei por absoluta incompatibilidade ideológica, porque formado fundamentalmente por gente com esse perfil, com esse tipo de pensamento sufocador do outro, tudo ficou muito mais claro – mas esse é outro assunto.

Ora, se eu militava na juventude com toda aquela dificuldade de meios, não seria agora, cinquentenário e tendo meios muito mais fáceis, eficazes e abrangentes de produção, exposição e alcance que eu iria coibir minha liberdade de pensamento e expressão, não é mesmo?

É você tem razão. É fácil chamar Zé Dirceu de “canalha”, de “mensaleiro” ou qualquer outro rótulo. É fácil dizer que Genoíno é “ladrão”, “corrupto”, embora isso atente até mesmo contra os fatos aos quais se refere quem assim o chama, por absoluta ignorância. É fácil nos chamar, a todos nós petistas, de “quadrilheiros”, “corja” e outras desonras afins. É fácil rotular a partir de impressões pessoais, como as que você diz que nutre por Dirceu desde tempos imemoriais. Lamento informar Vossa Excelência, mas para mal de seus pecados, sua opinião vale tanto quanto a minha. Como prova judicial, não valem nada, nem a sua, nem a minha.
A minha ideologia, meu caro, é só e exatamente o contrário da ideologia que você prega. Nem mais, nem menos.

E nesse jogo de espelhos, que não me arrisco a jogar porque você faz melhor do que eu, é igualmente válido afirmar que toda afirmação de “fatos ou razões explicadas por ‘verdades a priori’ torna-se má-fé ou, na melhor das hipóteses, ignorância”. Assino embaixo.

Palocci nunca foi objeto de minha “propaganda política”, decerto por razões coincidentes com as suas. E espero que, tendo você a inteligência que tem, não imagine que pecados – ou quiçá ilícitos – porventura cometidos por ele (a justiça, a justiça comum, o absolveu de todas as acusações) contaminem todo o partido, ou o governo, ou o projeto que temos para o país. 

O que me preocupa, sempre, é a injustiça. Injustiça com Genoíno, hoje preso apenas porque, como presidente do partido, assinou – porque era sua obrigação assinar – um contrato de empréstimo, legítimo, pago pelo partido e aprovado pela Justiça Eleitoral. Injustiça contra Dirceu, que, apenas por ser Ministro de Estado de um governo malquisto pelos detentores do verdadeiro poder, o econômico – aqueles a quem rotulamos “direita”, “elites” etc., nesse nosso afã incontrolável de rotular a tudo e a todos – foi acusado de chefiar uma “quadrilha”. Uma “quadrilha”, leia-se, que seria o partido ao qual aderi desde a adolescência. Que chegou ao poder e, efetivamente – reconhece-o o mundo todo! – provocou uma revolução social neste país. Bom, mas isto, certamente, é também parte da minha propaganda ideológica, e que ONU, OMS e outros organismos internacionais, instituições de ensino estrangeiras, governos de outros países vão às favas, não é mesmo?

Não, a verdade não me pertence. Mais uma vez, sou obrigado a dar a mão à palmatória e reconhecer que você tem razão. Não pertence nem a mim, nem a você, nem aos que detratam os chamados “mensaleiros”, meu caro, os que os condenaram a priori e agora não aceitam a decisão judicial definitiva, como nunca aceitaram a hipótese de inocência deles.

Nessa área, o que vale é a prova dos autos. Sim, pois falamos de supostos crimes, de processo penal, de condenações que exigem provas. A verdade do juiz é a verdade revelada pelos autos. Se não há provas, não há verdade juridicamente válida.

O julgamento do "mensalão" passará para a história por várias razões. Uma delas, pelo aspecto político. Você deve ter visto Celso de Mello – que serviu a Saulo Ramos, no governo Sarney, pelas mãos de quem chegou ao Supremo - votando, aliás, discursando, vociferando contra o PT, acusando-nos de “tomar de assalto (palavra escolhida a dedo) as estruturas governamentais” e de pretendermo-nos “perpetuar no poder”. Isso lá é discurso jurídico? É voto, juridicamente aceitável? Não, meu caro. Razões políticas não sustentam decisões judiciais. Não podem. Não poderiam... 

Interessante foi ver o esforço dele em repetir expressões como “as provas dos autos...”, os “crimes praticados...”, a “quadrilha ou bando...”, mas sem dedicar uma única palavra a expor quais seriam as “provas” e quais seriam os “crimes” – tecnicamente falando. Um evidente esforço retórico, decerto para tentar convencer-se a si mesmo da presença do que não existe, das “provas” e dos “crimes”, já que, como técnico do direito, Celso costuma ser impecável e digno da minha admiração.

Nem vou falar do Gilmar Mendes, o coronel de Diamantino, ou de Marco Aurélio, da oligarquia alagoana. Nem mesmo de Joaquim Barbosa, que serviu a Golbery nos governos militares, cuja truculência e arbitrariedade ele mesmo não faz a mínima questão de disfarçar.
Mas a ausência absoluta de provas foi detectada por vários outros ministros, tendo a ministra Rosa Weber – e isso eu testemunhei, porque assistia à transmissão ao vivo, da mesma maneira como testemunhei os demais votos a que me referi – ter dito que “não há prova cabal contra Dirceu, mas voto pela condenação porque a literatura me permite”. Ela devia estar-se referindo à literatura policial, de Agatha Christie e Conan Doyle, em cujas obras as soluções são dadas por dedução, por meras ilações...

Outra razão. Esse julgamento será histórico pela atipicidade técnica. Começou com uma denúncia rançosa, de caráter evidentemente político, sem sustentação fática, uma verdadeira “obra de ficção”, como alguém destacou. Não, não estou repetindo o que ouvi, não. Eu a li, digo-o como técnico do direito. Denúncia, você sabe, é a peça jurídica construída pelo Procurador Geral da República, o anterior ao Gurgel, aquela que inicia o processo, propriamente dito. Tão deficiente que foi assim qualificada pelo próprio relator, ele mesmo, Joaquim Barbosa, à época em que este iniciava seus trabalhos, segundo testemunho ontem publicado pelo jornalista Felipe Rocondo (acho que é esse o nome), do suspeitíssimo Estadão... Seguiu com a utilização indevida, inadequada, de uma teoria denominada “domínio dos fatos”, cujo autor, um alemão, ele próprio citou a inadequação ao caso. Só porque era ministro, daí se concluía que Dirceu era o “chefe da quadrilha”... Passou até mesmo pela condenação artificialmente dosada para escapar da prescrição, como relata o mesmo jornalista. Terminou numa “triste tarde” com um discurso do próprio Barbosa, em que este, desmascarado, buscou desqualificar seus próprios pares, inclusive os que votaram com ele, como Celso de Mello e Marco Aurélio, e atingiu os demais poderes, o Executivo e o Legislativo.

Passará para a história também como o maior erro judiciário brasileiro. Aliás, não se trata de erro, propriamente dito, mas dolo. Dolo específico de prejudicar, de perseguir, de condenar representativos dirigentes de um partido que, segundo seus algozes, não poderia ter chegado ao poder e não pode nele permanecer, a ser derrubado custe o que custar. Perseguição que segue até hoje, seja porque os presos em regime semiaberto cumprem as penas, na prática, em regime fechado, seja porque Barbosa empreende a mais insana sequência de atos de sufocação dos presos, já mais do que suficientemente humilhados.

Enfim, tenho outros afazeres urgentes e não quero tomar mais do seu precioso tempo, embora você tenha tido a elegância de me dedicar valiosos instantes do seu para me dirigir sua mensagem (que achei por acaso, você precisa aprender a usar o recurso "marcar", do Face), para me dizer o quanto minha “mialitância ideológica” o incomoda. Não, não vou mais incomodá-lo. Se ainda tiver tempo para mais um texto de minha autoria, que de vez em quando repito aqui, conforme a necessidade, convido-o a lê-lo clicando neste link: 

https://www.facebook.com/notes/luís-antônio-albiero/aos-meus-parentes-amigos-e-conhecidos-da-vida-real/695824653770867 

Você, M. A., G. e todos de sua família são pessoas que admiro e a quem quero muito bem. Não se sintam, pois, desprestigiados por eu os excluir da minha lista de amigos, aqui do Face. É só uma "amizade" (sic) virtual, afinal, que não se confunde com a amizade real. No texto, você compreenderá minhas razões. Faço-o justamente para preservar nossa amizade, real e sem aspas. Fique à vontade para visitar minha página, sempre que desejar.

Quando quiser e sentir saudades venha a Americana. Traga A. Se possível, traga An. também. Serão sempre bem-vindos em minha casa, como sempre foram. No ano que vem, se tudo correr bem e se eu e Luciana conseguirmos realizar nosso velho projeto de construir nossa casa própria, voltaremos a residir aí e nossos encontros haverão de tornar a ser frequentes. Desde que, claro, não tratemos de política. Muito menos de ideologia...

Beijos à A., lembranças ao bom e velho J. e a todos aí. Fiquem em paz.

PS.: a poesia emoldura a realidade, mas esta é obra que se constrói com atos concretos. Decerto, os poetas incomodam menos que os construtores.

Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de American/SP
laalbiero@yahoo.com.br

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