Meu querido amigo N. F. de
ontem, de hoje e de sempre. Fico feliz que tenha dedicado alguns minutos a este
pobre diabo que o incomoda tanto com sua, minha, propaganda ideológica... Não me imaginava digno de tal deferência.
É, meu amigo, você
tem toda razão. Difícil é livrar as pessoas da apreensão simplista da
realidade, do senso comum ou da fé positivista nos fenômenos. Eu que o diga. Há
anos luto contra o simplismo, o senso comum rotulado “mensalão”.
Eis aí o grande
exemplo da sua proposição. Basta mencionar a palavra, o rótulo meticulosamente
engendrado e repetido ao longo dos anos – nove anos! - para as pessoas
assimilarem do que se trata. E toda uma “verdade indiscutível” se constrói no
imaginário das pessoas. É - você tem razão, é a força avassaladora da
propaganda ideológica.
E não adianta invocar a razão. Não adianta
mencionar fatos, ou ausência deles. Não adianta citar provas em contrário,
tampouco a ausência de provas de sua existência. As pessoas introjetaram essa
“verdade subjacente” – repetindo uma vez mais seu Léfort. Coisa de fazer inveja
a Goebbels.
Desculpe-me, não
sabia que o incomodava tanto a minha militância – que ontem foi acusada de ser
“remunerada”, mas decerto também neste caso pugnar por provas, fontes ou lógica
racional não vai adiantar, talvez nem invocar minha história nesse campo. Devo
confessar que a massiva propaganda ideológica em contrário, que recebo minuto a
minuto no Face, de incontáveis fontes, também me perturba, porque conspurca meu
espaço virtual com disseminação de ódio e preconceito e eu não tenho forças,
nem disposição para rebater a todas as postagens com conteúdo racista, raivoso,
que as pessoas não se pejam de expor.
Perturba-me ver
comparações, por exemplo, entre Lula e os presidentes militares, extraindo-se
daí a inacreditável conclusão de que os militares seriam “mais éticos” (sic!)
ou mais eficazes que nosso estadista maior... Ops! Desculpe-me, chamar Lula de
“estadista”, e ainda mais de "maior", a você certamente soará como
mais um capítulo de propaganda ideológica. Mas é o que penso e não vou estender
este texto ao ponto de repetir tudo o que venho dizendo há tempos. Vou
poupar-lhe tempo.
Minha militância,
você sabe, começou na adolescência. Desde então, estou acostumado a enfrentar
os narizes torcidos, as incompreensões, os rancores, o ódio mesmo dos
reacionários da nossa amada Capivari. Por aquela época, um simples distribuir
panfletos, nas feiras, de madrugada, ou de porta em porta, sob sol e sob chuva
– às vezes produzidos por mim mesmo, com meus próprios recursos, sem patrocínio
sequer do partido; uma vez produzidos por você, lembra-se? – já incomodava os
que, hoje percebo, advogam a ideia do pensamento único. No grupo “Amigos
Capivari”, aqui do Face, do qual me retirei por absoluta incompatibilidade
ideológica, porque formado fundamentalmente por gente com esse perfil, com esse
tipo de pensamento sufocador do outro, tudo ficou muito mais claro – mas esse é
outro assunto.
Ora, se eu militava
na juventude com toda aquela dificuldade de meios, não seria agora,
cinquentenário e tendo meios muito mais fáceis, eficazes e abrangentes de
produção, exposição e alcance que eu iria coibir minha liberdade de pensamento
e expressão, não é mesmo?
É você tem razão. É
fácil chamar Zé Dirceu de “canalha”, de “mensaleiro” ou qualquer outro rótulo.
É fácil dizer que Genoíno é “ladrão”, “corrupto”, embora isso atente até mesmo
contra os fatos aos quais se refere quem assim o chama, por absoluta
ignorância. É fácil nos chamar, a todos nós petistas, de “quadrilheiros”,
“corja” e outras desonras afins. É fácil rotular a partir de impressões
pessoais, como as que você diz que nutre por Dirceu desde tempos imemoriais.
Lamento informar Vossa Excelência, mas para mal de seus pecados, sua opinião
vale tanto quanto a minha. Como prova judicial, não valem nada, nem a sua, nem
a minha.
A minha ideologia,
meu caro, é só e exatamente o contrário da ideologia que você prega. Nem mais,
nem menos.
E nesse jogo de
espelhos, que não me arrisco a jogar porque você faz melhor do que eu, é
igualmente válido afirmar que toda afirmação de “fatos ou razões explicadas por
‘verdades a priori’ torna-se má-fé ou, na melhor das hipóteses, ignorância”.
Assino embaixo.
Palocci nunca foi objeto de minha “propaganda
política”, decerto por razões coincidentes com as suas. E espero que, tendo
você a inteligência que tem, não imagine que pecados – ou quiçá ilícitos –
porventura cometidos por ele (a justiça, a justiça comum, o absolveu de todas
as acusações) contaminem todo o partido, ou o governo, ou o projeto que temos
para o país.
O que me preocupa,
sempre, é a injustiça. Injustiça com Genoíno, hoje preso apenas porque, como
presidente do partido, assinou – porque era sua obrigação assinar – um contrato
de empréstimo, legítimo, pago pelo partido e aprovado pela Justiça Eleitoral.
Injustiça contra Dirceu, que, apenas por ser Ministro de Estado de um governo
malquisto pelos detentores do verdadeiro poder, o econômico – aqueles a quem
rotulamos “direita”, “elites” etc., nesse nosso afã incontrolável de rotular a
tudo e a todos – foi acusado de chefiar uma “quadrilha”. Uma “quadrilha”,
leia-se, que seria o partido ao qual aderi desde a adolescência. Que chegou ao
poder e, efetivamente – reconhece-o o mundo todo! – provocou uma revolução
social neste país. Bom, mas isto, certamente, é também parte da minha
propaganda ideológica, e que ONU, OMS e outros organismos internacionais,
instituições de ensino estrangeiras, governos de outros países vão às favas,
não é mesmo?
Não, a verdade não
me pertence. Mais uma vez, sou obrigado a dar a mão à palmatória e reconhecer
que você tem razão. Não pertence nem a mim, nem a você, nem aos que detratam os
chamados “mensaleiros”, meu caro, os que os condenaram a priori e agora não
aceitam a decisão judicial definitiva, como nunca aceitaram a hipótese de
inocência deles.
Nessa área, o que vale é a prova dos autos. Sim,
pois falamos de supostos crimes, de processo penal, de condenações que exigem provas.
A verdade do juiz é a verdade revelada pelos autos. Se não há provas, não há
verdade juridicamente válida.
O julgamento do "mensalão" passará para a
história por várias razões. Uma delas, pelo aspecto político. Você deve ter
visto Celso de Mello – que serviu a Saulo Ramos, no governo Sarney, pelas mãos
de quem chegou ao Supremo - votando, aliás, discursando, vociferando contra o
PT, acusando-nos de “tomar de assalto (palavra escolhida a dedo) as estruturas
governamentais” e de pretendermo-nos “perpetuar no poder”. Isso lá é discurso
jurídico? É voto, juridicamente aceitável? Não, meu caro. Razões políticas não
sustentam decisões judiciais. Não podem. Não poderiam...
Interessante foi ver o esforço dele em repetir
expressões como “as provas dos autos...”, os “crimes praticados...”, a
“quadrilha ou bando...”, mas sem dedicar uma única palavra a expor quais seriam
as “provas” e quais seriam os “crimes” – tecnicamente falando. Um evidente
esforço retórico, decerto para tentar convencer-se a si mesmo da presença do
que não existe, das “provas” e dos “crimes”, já que, como técnico do direito,
Celso costuma ser impecável e digno da minha admiração.
Nem vou falar do
Gilmar Mendes, o coronel de Diamantino, ou de Marco Aurélio, da oligarquia
alagoana. Nem mesmo de Joaquim Barbosa, que serviu a Golbery nos governos
militares, cuja truculência e arbitrariedade ele mesmo não faz a mínima questão
de disfarçar.
Mas a ausência
absoluta de provas foi detectada por vários outros ministros, tendo a ministra
Rosa Weber – e isso eu testemunhei, porque assistia à transmissão ao vivo, da
mesma maneira como testemunhei os demais votos a que me referi – ter dito que
“não há prova cabal contra Dirceu, mas voto pela condenação porque a literatura
me permite”. Ela devia estar-se referindo à literatura policial, de Agatha
Christie e Conan Doyle, em cujas obras as soluções são dadas por dedução, por
meras ilações...
Outra razão. Esse julgamento será histórico pela
atipicidade técnica. Começou com uma denúncia rançosa, de caráter evidentemente
político, sem sustentação fática, uma verdadeira “obra de ficção”, como alguém
destacou. Não, não estou repetindo o que ouvi, não. Eu a li, digo-o como
técnico do direito. Denúncia, você sabe, é a peça jurídica construída pelo
Procurador Geral da República, o anterior ao Gurgel, aquela que inicia o
processo, propriamente dito. Tão deficiente que foi assim qualificada pelo
próprio relator, ele mesmo, Joaquim Barbosa, à época em que este iniciava seus
trabalhos, segundo testemunho ontem publicado pelo jornalista Felipe Rocondo
(acho que é esse o nome), do suspeitíssimo Estadão... Seguiu com a utilização
indevida, inadequada, de uma teoria denominada “domínio dos fatos”, cujo autor,
um alemão, ele próprio citou a inadequação ao caso. Só porque era ministro, daí
se concluía que Dirceu era o “chefe da quadrilha”... Passou até mesmo pela
condenação artificialmente dosada para escapar da prescrição, como relata o
mesmo jornalista. Terminou numa “triste tarde” com um discurso do próprio
Barbosa, em que este, desmascarado, buscou desqualificar seus próprios pares,
inclusive os que votaram com ele, como Celso de Mello e Marco Aurélio, e
atingiu os demais poderes, o Executivo e o Legislativo.
Passará para a
história também como o maior erro judiciário brasileiro. Aliás, não se trata de erro,
propriamente dito, mas dolo. Dolo específico de prejudicar, de perseguir, de
condenar representativos dirigentes de um partido que, segundo seus algozes,
não poderia ter chegado ao poder e não pode nele permanecer, a ser derrubado
custe o que custar. Perseguição que segue até hoje, seja porque os presos em
regime semiaberto cumprem as penas, na prática, em regime fechado, seja porque
Barbosa empreende a mais insana sequência de atos de sufocação dos presos, já
mais do que suficientemente humilhados.
Enfim, tenho outros afazeres urgentes e não quero
tomar mais do seu precioso tempo, embora você tenha tido a elegância de me
dedicar valiosos instantes do seu para me dirigir sua mensagem (que achei por
acaso, você precisa aprender a usar o recurso "marcar", do Face),
para me dizer o quanto minha “mialitância ideológica” o incomoda. Não, não vou
mais incomodá-lo. Se ainda tiver tempo para mais um texto de minha autoria, que
de vez em quando repito aqui, conforme a necessidade, convido-o a lê-lo clicando
neste link:
https://www.facebook.com/notes/luís-antônio-albiero/aos-meus-parentes-amigos-e-conhecidos-da-vida-real/695824653770867
Você, M. A., G. e todos de sua família são pessoas
que admiro e a quem quero muito bem. Não se sintam, pois, desprestigiados por
eu os excluir da minha lista de amigos, aqui do Face. É só uma
"amizade" (sic) virtual, afinal, que não se confunde com a amizade real.
No texto, você compreenderá minhas razões. Faço-o justamente para preservar
nossa amizade, real e sem aspas. Fique à vontade para visitar minha página,
sempre que desejar.
Quando quiser e sentir
saudades venha a Americana. Traga A. Se possível, traga An. também. Serão
sempre bem-vindos em minha casa, como sempre foram. No ano que vem, se tudo
correr bem e se eu e Luciana conseguirmos realizar nosso velho projeto de
construir nossa casa própria, voltaremos a residir aí e nossos encontros
haverão de tornar a ser frequentes. Desde que, claro, não tratemos de política.
Muito menos de ideologia...
Beijos à A., lembranças ao bom e velho J. e a todos
aí. Fiquem em paz.
PS.: a poesia emoldura a realidade, mas esta é obra
que se constrói com atos concretos. Decerto, os poetas incomodam menos que os
construtores.
Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de American/SP
laalbiero@yahoo.com.br