Mensagem

Faça seu comentário no link abaixo da matéria publicada.

quarta-feira, 26 de março de 2014

A violência da manipulação das informações para a sociedade

Figura: vidateorica.blogspot.com

A maioria dos veículos de comunicação do Brasil (70% deles) pertence a seis famílias abastadas brasileiras e como seres pensantes que já fizeram suas escolhas, não só em termos de candidatos, mas precisamente em termos de valores políticos, econômicos e sociais, ditam as regras, confundem a cabeça do povo e buscam a volta ao passado, indignados com essa história de pobre poder ter e fazer tantas coisas, que num passado recente eram privilégios somente da Casa Grande, enquanto as Senzalas ficavam apenas com as sobras.

Isso poderia até parecer natural num país de uma democracia tão recente, onde todos tem o direito de se expressar da forma que quiser e como quiser. O problema está na medida em que esses veículos de comunicação se julgam no direito de venderem a ideia de que falam a verdade da sociedade e se enfurecem quando detectam setores organizados que emitem pensamentos contrários, principalmente se colocarem em risco a hegemonia dos setores produtivos e reivindicarem a manutenção e ampliação dos direitos trabalhistas.

Infelizmente a população menos esclarecida não consegue enxergar essa luta ideológica travada no interior do sistema e tendem a concordar com o que leem, ouvem ou assistem, até mesmo por não ter um canal de comunicação que mostre o outro lado da moeda e assim passa a reproduzir uma linguagem viciada e tendenciosa, que coloca em xeque todos os dias a importância dos partidos políticos, dos sindicatos, das cotas para os negros e para a população pobre e principalmente a importância dos pleitos eleitorais, onde muita gente perdeu a vida para que isso ocorresse.

Onde está o problema central? É possível enxergar com clareza o que um candidato se propõe? Porque a população tende a entrar no senso comum?

Quero acreditar que o problema central está na interpretação equivocada da democracia, onde se passa a ideia de que a representatividade é suficiente para eleger pessoas, mesmo sem se conhecer e esses representar os direitos e as reivindicações da sociedade desorganizada.

Enquanto isso, quem aposta na participação como principal alternativa fica como se estivesse fazendo parte de algo que não é bom. Algo subversivo, onde a subversão é “peitar” os de cima em detrimento aos direitos dos de baixo.

Já que a população mais necessitada não tem um veículo de comunicação que conte as duas histórias, se faz necessário organizá-la, seja em fóruns, em entidades de moradores ou mesmo em partidos políticos que visem a discussão dos seus valores. Assim, mesmo os candidatos que não forem indicados pelos setores organizados, ditos “expertos”, saberão que serão cobrados de outra forma. Ou seja, a partir de novos valores e informações.

O senso comum passa a ser a única opção visível, algo que a velha mídia reforça todos os dias, ao escrachar os políticos e a política, com o principal objetivo de direcionar corações e mentes do povo brasileiro, buscando um resultado comum para os anseios do pensamento elitista: político, econômico e social.

Nesse barco desgovernado do ponto de vista político-social, tentando confundir a cabeça do povo, estão uma quantidade enorme de políticos de carreira, grande parte dos partidos políticos e, sobretudo o PIG – Partido da Imprensa Golpista, que tenta calar a voz das ruas, substituindo-a pelo eco rouco da ditadura midiática.

Em se tratando de gestão pública, que sempre foi tratada como uma “terra de ninguém”, a única forma segura de saber se determinada Política Pública deu certo ou não, é ouvindo a população e todos os atores envolvidos.


Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Coordenador do Programa de Capacitação Continuada
em Gestão Pública da Fundação Perseu Abramo
toni.cordeiro1608@gmail.com

Resolução Política do Diretório Nacional do PT

Reproduzindo o que é importante 

Reunido no dia 20 de março de 2014 em Brasília, o Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, aprovou a seguinte resolução política:
O povo brasileiro chega ao final do primeiro trimestre de 2014 com a certeza de poder comemorar, ao mesmo tempo, a consolidação e o aprimoramento da nossa democracia, que venceu o obscurantismo dos tempos de ditadura; e o avanço na superação das desigualdades sociais, nunca experimentado com tamanha amplitude quanto agora.
O Partido dos Trabalhadores tem por objetivo vencer as eleições presidenciais de 2014, reelegendo a Presidenta Dilma Rousseff para um segundo mandato por dois motivos fundamentais: porque fazemos um balanço globalmente positivo de seu mandato e para dar continuidade às transformações no Brasil, iniciadas pelo Presidente Lula em 2003.
Quando são lembrados os 50 anos do golpe e da instalação da ditadura militar, é preciso que façamos uma análise crítica sobre o inacabado processo de transição democrática. Saudamos a coragem e determinação de nosso governo em instalar e fazer funcionar de forma autônoma a Comissão Nacional da Verdade e apontamos a necessidade de que esta comissão vá além do papel de coletar dados e informações sobre as atrocidades cometidas naqueles tempos, e realize um amplo debate público sobre o direito à memória.
Foi a longa e incansável luta de nosso povo que derrotou aquele regime e instalou, naquele momento, uma tênue democracia, que agora se aprimora e se consolida, mas que segue em construção. Para que possamos ter uma democracia plena devemos criar as condições para a não repetição de situações como as vividas naquelas épocas sombrias.
A identificação dos responsáveis pela tortura e pelos assassinatos, longe de parecer revanche, deve servir para que nosso povo tenha conhecimento dos reais autores de tanta tristeza provocada a milhares de famílias brasileiras. Mas para que façamos justiça aos democratas, socialistas, religiosos, estudantes, jovens, donas de casa, trabalhadores e tantos outros que sofreram a covardia da cruel agressão física e da supressão das liberdades democráticas, é preciso que tenhamos posição enfática em prol da revisão da Lei de Anistia.
Neste contexto saudamos a ação da bancada petista na Câmara dos Deputados pela reconquista da Comissão de Direitos Humanos, fazendo com que ela retome suas funções legítimas e históricas.
É por tudo isso que os petistas, em todos os cantos do país, devem se juntar a outros partidos e aos movimentos sociais para festejar a democracia sob o lema “Ditadura, nunca mais!”
Foi esta democracia que possibilitou que o primeiro operário e a primeira mulher fossem eleitos Presidentes do Brasil, ambos filiados ao nosso PT. E foi pelo compromisso de nosso Partido com as causas dos menos favorecidos, que nossos governos aplicaram políticas de superação da miséria, de diminuição das desigualdades sociais, de ampliação dos direitos e das oportunidades, de combate a todas as formas de discriminação.
Passado meio século do golpe que interrompeu a agenda progressista de reformas de base anunciadas naquele tempo, o Brasil experimenta os avanços do ciclo virtuososo dos governos liderados por Lula e Dilma. Nestes 12 anos, avançamos em reformas significativas para o país, mas nos deparamos com o desejo cada vez mais latente de realizarmos um conjunto de reformas estruturantes, já apontadas no 5° Congresso do PT.
Esse salto no programa a ser apresentado pelo PT será conformado a partir da mobilização e no diálogo com os movimentos sociais e através do debate político com os partidos que compõem a nossa base aliada.
Nos governos Lula e Dilma comemoramos constantemente o aumento do emprego. Temos hoje uma das menores taxas de desemprego da história do país combinada com o aumento da renda dos trabalhadores e a ascensão social de amplas camadas da população. Enquanto o restante do mundo enfrenta crises econômicas e sofre com índices de desemprego alarmantes, o Brasil demonstra estar preparado para enfrentar todas as adversidades originadas na globalização excludente.
Enquanto nossos opositores, nos partidos e na imprensa, cantavam a quatros cantos que o Brasil poderia ter um pequeno crescimento econômico ou até não crescer, os dados demonstraram que nossos caminhos são seguros e nosso crescimento sustentável. Crescemos acima da média de centenas de países, sem submissão às políticas recessionistas e excludentes que são aplicadas mundo afora!
Mesmo assim, parcela da mídia brasileira faz questão de pintar um quadro aterrorizador na economia, disseminando maus presságios sem fundamentos técnicos, apenas com a clara intenção de tentar influenciar nas disputas eleitorais. Chega a ser impressionante a distância apresentada por uma parcela da mídia entre o Brasil verdadeiro, governado pelo PT, e o Brasil “deles”.
É fundamental que o PT apoie firmemente todos os movimentos e iniciativas que busquem a democratização das comunicações e uma nova ordem de informação a nível internacional. Neste caminho é que nossas bancadas no Congresso Nacional devem se esforçar para aprovar o novo marco civil para a internet, com a neutralidade da rede proposta pelo governo.
Além disso, devemos nos somar à iniciativa da CUT e outras entidades e ampliar as ações que defendem a democratização da mídia através do Movimento para Expressar a Liberdade, fazendo com que este debate chegue aos sindicatos, universidades, escolas, igrejas, campos de futebol, etc. Somente com a ação firme de nossos militantes é que esta campanha ganhará as ruas.
Ao mesmo tempo devemos nos preparar para um dos maiores eventos esportivos do mundo , a Copa do Mundo, que ocorrerá no Brasil a partir de junho. Os “velhos do Restelo”, parafraseando Camões, ficam agourando o insucesso da Copa no Brasil. Tentam, de todas as formas, estimular manifestações contrárias e alardeiam a inexistência de legado a ser deixado pelo campeonato mundial. A geração de empregos, a atração de turistas de todos os cantos do mundo e as obras estruturantes – especialmente as de mobilidade urbana em todas as cidades sedes – são ‘causa e consequência’ da realização do Mundial de Futebol no país.
Foi o governo do Presidente Lula que conseguiu vencer a disputa pela realização da Copa em 2014 e das Olimpíadas em 2016 e esses eventos esportivos mundiais são motivos de orgulho para nosso povo, pois vamos realizar uma das melhores Copas – e, posteriormente, as Olimpíadas – de toda a história.
Não nos omitiremos, entretanto, de participar dos espaços das organizações e movimentos que, sintonizados com essa compreensão do significado dos grandes eventos para o desenvolvimento e projeção do Brasil no exterior, discutem seu legado popular. Vamos usar estas oportunidades para repudiar toda e qualquer forma de manifestação racista, seja no esporte ou contra qualquer cidadão da etnia negra. Apoiamos a posição do governo brasileiro que tem condenado as práticas racistas, xenofóbicas e de todo o tipo de intolerância.
Por outro lado, o Diretório Nacional adverte para iniciativas legislativas que, em nome do combate a ações violentas em manifestações, venham a se converter em restrições dos direitos constitucionais e a repressão a ações legitimas e pacificas dos movimentos sociais.
Sobre a Ação Penal 470, o Diretório Nacional registra a decisão do Supremo Tribunal Federal, que inocentou os companheiros do PT dos crimes de formação de quadrilha e de lavagem de dinheiro. Ao mesmo tempo, repele as denúncias forjadas sobre privilégios inexistentes para os companheiros ilegalmente aprisionados na Papuda. É inaceitável a manutenção de companheiros no regime fechado quando, por lei, já teriam direito ao regime semi-aberto.
Mais uma vez estamos presenciando a oposição e os setores conservadores da nossa sociedade fazer ataques para atingir a imagem da Petrobras. É importante relembrarmos que a nossa maior empresa pública foi alvo da política de privatizações no governo liderado pelo PSDB, apoiado pela elite nacional, representado por FHC.
A Petrobras é a mais sólida das empresas brasileiras com um lucro superior a 23 bilhões de Reais, e a sétima empresa de energia do mundo, tornando-se competitiva no mercado internacional e simbolizando o arrojo do nosso projeto de Nação. A tentativa da oposição e do conservadorismo nacional em atacar a Petrobras é mais uma iniciativa daqueles que sucatearam o Estado brasileiro e aprofundaram as desigualdades sociais.
A defesa intransigente da Petrobras é a defesa do nosso projeto de Nação que tem resultado no crescimento econômico e na justiça social. Um projeto que colocou o Brasil “em pé” perante o mundo.
Com a aproximação das eleições, nosso Partido deve aprofundar o debate sobre nossas alianças, criando as condições objetivas para a vitória de nosso projeto com a reeleição da Presidenta Dilma. O que devemos ter claro é a nossa opção pela política de alianças firmada no programa de transformações sociais que nossos governos estão promovendo. O que devemos exigir de nossos aliados é o forte compromisso com a continuidade destas conquistas e com os avanços que vamos construir conjuntamente.
Nossa prioridade absoluta é a reeleição da Presidenta Dilma. A esta prioridade está submetida nossa tática e nossas alianças estaduais conforme foi decidido pelos delegados presentes no 4º. Congresso Nacional. Mesmo com os altos índices de aprovação de nosso Governo e de nossa candidata ainda temos muito tempo até as eleições. A nossa militância precisa estar atenta. É preciso manter a mobilização, ampliar o debate com a sociedade e defender nosso legado de 12 anos de mudanças no país.
A direção nacional do PT acompanhará os processos nos estados e no DF e coordenará em conjunto com as direções estaduais o processo de decisões sobre a tática eleitoral. Não vamos permitir alianças que conflitem com nossas deliberações, assim como vamos estimular as chapas com nossos aliados no plano nacional.
Está dentro dos nossos objetivos, de acordo com as resoluções do 4º.  Congresso Nacional, a ampliação de nossas bancadas parlamentares, tanto nas Assembléias Legislativas quanto no Congresso Nacional e reeleição de nossos governadores e a eleição de novos governos petistas e aliados nos Estados.
Da mesma forma, vamos apoiar a luta dos movimentos sociais e partidos democráticos pela convocação da uma Constituinte Exclusiva e Soberana para realizar a reforma política que o país tanto precisa. Vamos estimular a coleta de assinatura no abaixo-assinado do PT. Neste sentido, conclamamos nossos militantes a assumirem e organizarem esta campanha em todas as cidades.
Nosso Partido deve estar comprometido com as lutas do movimento sindical e ser contra o Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional prevendo a terceirização de mão de obra e a precarização dos empregos no país, se associar ao movimento em prol da votação imediata do Plano Nacional de Educação, assim como devemos nos somar aos sindicatos na luta pela ampliação dos direitos dos trabalhadores.
Nosso Partido também deve se engajar firmemente nas lutas dos movimentos por moradia que buscam a construção de uma pauta pela reforma urbana com mais moradia, cidades mais sustentáveis, melhores condições de transportes e mais segurança. Fortalecer o programa “Minha Casa Minha Vida” é determinante, particularmente para a população de baixa renda. Da mesma forma, devemos nos somar à luta pelo fortalecimento da reforma agrária e por uma política agrícola, tendo como base os incentivos na agricultura familiar.
Reconhecemos que o ano eleitoral é um ano de profundas e acirradas disputas, especialmente quando estão em confronto visões de país tão distintas entre nós e nossos adversários. Temos que desmascarar a tática dos que torcem e jogam contra o Brasil. Nossos militantes devem estar preparados para estas disputas. Nosso desafio é continuar em frente nas conquistas de nosso povo.
Nossos militantes devem estar preparados para este embate. Nossos governos são governos de conquistas e avanços, que devem permanecer e seguir adiante. É para isso que construímos e consolidamos nosso Partido.
Brasília, 20 de março de 2014.

Silvana Barboza Cordeiro
Mestranda em Políticas Pública pela Fundação Perseu Abramo
silvana_barboza@ig.com.br

terça-feira, 25 de março de 2014

Franca uma cidade sem governo

Franca é uma cidade que - desde pequeno - sempre tive carinho e que em muito me desperta atenção. Principalmente pelas pessoas hospitaleiras, clima ameno e dinamismo. A cidade é economicamente estratégica devido seu pólo calçadista. É referência em diferentes aspectos.
De um tempo para cá tenho procurado compreender melhor o dinamismo da cidade, suas relações políticas, de governo e as demandas da população. Do ponto-de-vista analítico tem sido um enorme laboratório. Entretanto, referente ao humanismo: a experiência é de lamento, choque, sentimento de impotência. Já li em muitos livros sobre a barbárie que pode chegar o ser humano em condições extremamente precárias. Quando este sente que não tem mais vez e nem voz. Nem mesmo o necessário.
O conceito de anarquismo é o fim do Estado. Ou seja, a sociedade que se "regulamenta" por si só. E é exatamente a situação que Franca vive e enfrenta hoje. Um (des)governo ausente. Mas não ausente apenas por não fazer. E sim uma ausência que destrói, preocupa e vitimiza. Não são casos pontuais. É uma sequência de erros. São pessoas nas filas dos hospitais com mau atendimento, um número desumano de óbitos na pasta da saúde com famílias enlutadas. É a relação enrijecida e esgotada com a ACIF - Associação do Comércio e Indústria de Franca: com um contato que amplia gargalos ao invés de pensar alternativas conjuntas. São servidores (pais de família, trabalhadores, mulheres lutadoras) sendo tratados com desrespeito e nenhuma valorização.

Quando embolam tantas crises ao mesmo tempo se estabelece um caos. A população perde direção. O resultado é o cidadão contra o servidor e vice-versa. Perde-se o controle e os limites. O vídeo deste blog (segue) me faz refletir mais e mais sobre a cidade, gestão pública com eficiência/efetividade e, principalmente, muita valorização e compromisso com as pessoas. Resumindo, é somente para isto que deve servir a política: focar e valorizar as pessoas. O resto é o que vemos acontecendo por aí: irresponsabilidade, inconsequência e muita dor. No fundo, quem verdadeiramente sabe é quem sente. 
No link abaixo o Programa Alerta Geral registra um “quebra pau” no Pronto Socorro.
Bruno Santana
Ativista, Militante e Colaborador Político e Social
brunolsantana@yahoo.com.br

segunda-feira, 24 de março de 2014

BRASA DORMIDA

Entre um gole e outro de café, na livraria do shopping nesta tarde de domingo, ouvia eu, sem ter interesse nem como evitar, comentários de um ruidoso grupo que ocupava duas mesas ao meu lado. Eram homens e mulheres idosos cobertos por respeitáveis cãs. Uma delas, mais falante, dizia que, quando se formara professora, 51 anos atrás, alguém com autoridade desafiara sua turma de formandos a recuperar os “25 anos de atraso da educação brasileira”. Outro fez as contas e concluiu: “então, já são mais de 75 anos de atraso”!

Não preciso dizer que, a essa altura, minha audição aguçou-se e meu interesse concentrou-se naquela animada tertúlia. Um dia depois da frustrada “Marcha da Família”, à qual nem Deus se dignou a comparecer, parece-me natural minha curiosidade. E a primeira pérola foi lançada no mesmo instante: “o PT acabou com a educação no país”.

Nessas horas, em que casualmente ouço opiniões desse jaez, o sangue ferve e fico sem saber o que fazer. O desejo é de me intrometer e, com a paciência costumeira, chamar os interlocutores ao raciocínio. Mas não posso, bem sei. Em qualquer situação, seria deselegante e um atrevimento que não seria bem recebido pela companhia.

Minha reação foi deixar o lugar. Levantei-me e fui ao caixa, pagar a conta. Deixei o café comentando em voz alta, mas sem qualquer pretensão de que os alegres avós me ouvissem: “o PSDB governa São Paulo há vinte anos e a culpa é do PT!”? A vontade era de, com educação, perguntar qual a lógica desse discurso. Se o ensino no Brasil tem um atraso de 75 anos, como é que o PT pode ser responsável por isso? E, ao mesmo tempo, informar ao grupo que a educação é de responsabilidade dos estados – no nosso caso, de um governo instalado há duas décadas! O dobro do tempo que o PT governa o Brasil.

A uns passos dali, minha esposa me contou outra pérola que ouvira enquanto eu acertava a conta: “o PT despertou o ódio de classe”, dissera a mesma senhorinha falastrona.

Irracionalidade à parte ocorreu-me o seguinte pensamento: essa coisa de o PT ter “despertado” o “ódio de classe” começa a me soar como uma observação verdadeira. Não, obviamente, como uma decisão proposital, consciente, mas como mero – e, quiçá, inevitável – resultado.

De fato, até a ascensão do partido ao poder, o miserável brasileiro repousava como brasa adormecida na fogueira social. Eles lá, aquietados no fundo da senzala, enquanto a minoria refestelava-se tranquila em confortáveis poltronas da casa grande. Vivia-se a paz dos cemitérios.

Lula soprou o braseiro. Levou à gente humilde alimento para matar-lhe a fome três vezes ao dia, esperança e confiança em que poderia conquistar bem mais que o pão nosso diário. Deu-lhe o peixe, mas também forneceu a vara, o anzol, a isca e lições de como pescar, tarefa que vem sendo complementada por Dilma. Ambos deram aos pobres de Cristo oportunidade de ocupar e usufruir dos recursos, públicos e privados, aos quais antes nem sonhavam ter acesso, como shoppings, bancos, aeroportos, planos de saúde, escolas e universidades públicas.

Como formigas alvoroçadas, a plebe passou a incomodar a nobreza, que se achava a salvo do formigueiro e que, de uma hora para outra, viu ameaçados seus privilégios.

Sem se dar conta, Lula e Dilma sopraram também a brasa dormida do sentimento que os da classe de cima sempre nutriram em relação aos negros e brancos habitantes da senzala. Nesse ponto, a velhinha de sóbrias cãs, fulgurantes olhos claros e pele alva tem lá sua razão, sobretudo em relação a si mesma.


Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de Americana/SP
laalbiero@yahoo.com.br

quarta-feira, 19 de março de 2014

A Marcha-à-Ré

Eu não tenho a menor preocupação com a tal Marcha que os extremistas estão prestes a promover, uma verdadeira marcha-a-ré na História do país, clamando pela “volta dos militares”. Mais uma vez se realizará a profecia de Karl Marx, para quem toda tragédia se repete como farsa. Será um espetáculo, no mínimo, cômico, tão ridículo como são os argumentos dos que defendem tal ignomínia.

Mas o tal evento abre oportunidade para, pelo menos, ampliar-se o debate na sociedade brasileira sobre o conceito de Política e, ao mesmo tempo, permite medir a que nível conseguem descer os que não são capazes de derrotar no voto o partido governista.

Travei recentemente um proveitoso debate particular com um conterrâneo, que dizia que os “marchistas” (não confundir com os “marxistas”, desafetos daqueles) não querem ditadura, nem o poder do Estado, nem mesmo um regime militar. Ele tentou explicar esse paradoxo, dizendo que “estamos suplicando aos militares que assumam o governo deste país justamente pelo que os políticos apresentaram nos últimos vinte anos”, ou seja, segundo ele, “enriquecimento ilícito pessoal com o nosso dinheiro”. E acrescentou que “todos os políticos são corruptos, nenhum presta”.

Então, é isso. Na base do discurso, o velho falso moralismo dos que se dizem incomodados com a “corrupção” vendida diariamente pela mídia, embora, desde o episódio do mensalão, em 2005 – em si mesmo, uma mal engendrada mentira –, não se tenha tido nenhuma notícia séria sobre o tema no âmbito do governo federal, alvo preferencial dos “marchistas”. E que nada dizem sobre sonegação – que por certo é prática corrente de muitos desses que se articulam em favor do golpe – e sequer enxergam corrupção em outras esferas de governo, como a robusta propina comprovadamente paga pelas multinacionais Siemens e Alstom a tucanos de alta plumagem que governam São Paulo.

Meu contendor dizia esperar que, com os militares no poder (provisoriamente, se bem entendi), seriam presos todos os políticos corruptos. Fui um tanto deselegante, ao fazer troça dessa ideia. Como é que os militares definiriam quais políticos são corruptos e quais não são? Poderes divinais? 

A partir da prisão em massa de todos os políticos – sim, porque todos são corruptos e nenhum presta – os “fichas limpas” poderiam concorrer aos cargos eletivos. Sugeri, então, que os novos “políticos” tivessem outra designação, como “marcianos”, “venusianos” ou “veganos”. Uai! Mas, afinal de contas, precisamos mesmo de uma intervenção militar para realizar algo que já existe? – objetei.

Disse a ele: “não sei se o decepciono, mas, por esse justíssimo critério, a atual presidenta, os ex-presidentes vivos - todos! Inclusive Collor e Sarney - são fichas limpas e têm totais condições de concorrer ao pleito. Como são fichas limpas (para meu desgosto, digo agora) José Serra, Alckmin, Eduardo Campos, Marina Silva, Joaquim Barbosa... Salvo engano, só Aécio Neves responde a processos por improbidade, mas parece que ainda não houve condenação por órgão colegiado, de modo que até ele deve ser ficha limpa”.

Lembrei ao meu amigo que o país já possui instituições sólidas de controle, fiscalização e punição a atos de corrupção em pleno funcionamento, como CGU, TCU, MPF, PF, Câmara dos Deputados, Senado Federal, controladorias internas nos estados e municípios, MP estaduais, polícias estaduais, TCE’s, assembleias legislativas, câmaras municipais. A par desses, há as organizações da própria sociedade, que deve se manter sempre ativa, participativa e vigilante. Mas o meu amigo diz não acreditar no funcionamento das instituições – e a culpa, obviamente, é do governo federal; e a saída, naturalmente, é um golpe de estado.

Ele insistiu em dizer que “a roubalheira é cada vez maior”, regurgitando essa comida estragada que servem diariamente os telejornais, rádios, jornais e revistas.

Sobre a ideia de que os militares tomariam o poder apenas para convocar eleições, escrevi: “mas ora veja! As eleições já estão convocadas! Serão daqui a apenas sete meses! E a ela, rigorosamente, só poderão concorrer os políticos fichas limpas. Por que incomodar desnecessariamente nossos bravos soldados?”.

Ele descrê da urna eletrônica, de modo que a intervenção serviria também para voltarmos à votação manual – mais uma marcha-a-ré. Argumentei que o PT vem amargando sucessivas derrotas eleitorais no estado de São Paulo, lá se vão vinte anos do tucanato, e nem por isso sai por aí alegando fraude nas urnas eletrônicas. Da mesma maneira, o PSDB já perdeu três eleições presidenciais para o PT e, igualmente, jamais vi alguma liderança tucana queixar-se de tal fraude. Nem o PSOL, sempre irrequieto, jamais acusou de fraudulentos os resultados que lhe garantiram bancadas minúsculas nas recentes eleições.

Lembrei o exemplo de minha própria cidade, de minha própria candidatura a prefeito, em 2004, quando fui derrotado. Outros concorrentes chegaram a me procurar para adotarmos uma atitude em conjunto, porque, ao ver deles, era “evidente” que teria havido fraude em favor do eleito. Não embarquei nessa e os demovi da ideia. 

Nas eleições seguintes, em 2008, o eleito teve dois terços dos votos válidos e não faltou gente séria que, usando dados estatísticos e matemáticos, alardeava que só poderia ter havido fraude. Nas últimas, em 2012, o prefeito, então candidato à reeleição – portanto, no exercício do cargo, dotado de maior poder e, presumivelmente, de mais recursos – foi derrotado pelo atual, que teve os mesmos 2/3 de votos que seu concorrente havia obtido nas anteriores. O que fizeram os críticos de antanho? Nada. Silenciaram, simplesmente. 

Será que quem detinha a fórmula da fraude perdeu-a? Ou, subitamente, deixou de querer vencer eleições? Será que as lideranças do PT, do PSDB, do PSOL e dos demais partidos, que vencem aqui e perdem ali, vencem hoje e perdem amanhã, são tolos a ponto de aceitar passivamente fraudes assim tão “evidentes”?

Encerrei minha participação no debate dizendo: “Meu caro, só existe uma maneira de resolver isso: no voto. Respeitando nossa Constituição, que prevê que todo poder emana do povo, que o exerce diretamente, na forma da lei, ou por seus representantes, eleitos pelo voto popular. Convido-o, pois, a respeitar a soberania da vontade popular, dos cerca de 150 milhões de brasileiros aptos a votar”.


Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de Americana/SP
laalbiero@yahoo.com.br

quinta-feira, 13 de março de 2014

As verdades e as mentiras que nos leva a pensar


Tem algumas coisas nas nossas vidas que não conseguimos explicar, como por exemplo, um estranho sentimento que passamos a ter quando nos envolvemos de corpo e alma por algo que começamos a gostar e esse gosto, uma vez correspondido, para a ser diário, contínuo e aos poucos começa a incorporar nossas próprias vidas.

Imagino que foi a partir dessa alusão que a tristeza foi inventada, pois alguém triste não tem poder nem de ação e muito menos de reação. A tristeza, por exemplo, de ver alguém ser preso ou assassinado injustamente, ou ser torturado pelos cães do sistema ou ainda de perder alguém ou algo que era de vital importância em suas vidas, deixa o ser humano frágil e uma presa fácil a ser controlada.

É bem provável que tenha sido por isso que inventaram a mentira de que política, religião e futebol não se discutem. Trata-se de três universos altamente subversivos em termos de envolvimento, mesmo que seja pela negação. Será que é a sedução implícita em cada um deles e que faz com que as pessoas simplesmente se apaixonem, que os tornou indecifrável para quem controla o poder? Por certo foi, é e ainda será.

Certa vez quando minha filha era bem pequena, numa caminhada pelo bairro onde morávamos e andávamos de mãos dadas, passeando com uma cachorra que tínhamos, algo inesperado ocorreu. De repente minha filha me surpreende ao perguntar: “Pai o que é política”? Logo eu que adora falar sobre aquilo, a meu ver com muita propriedade, fiquei por alguns segundos sem palavras. Simplesmente não sabia como lhe explicar que tudo que a vida nos oferece e tudo que fazemos vêm ou é da política.

Por alguns minutos estava eu ali diante dela tentando alinhavar um vocabulário que ela pudesse entender, além de desenhar um enredo que chegasse o mais próximo possível do que imaginava ser razoável, para responder a uma criança interessada de mais ou menos oito anos de idade o que é política. Um dos medos era o de não responder nem mentiras que a fizesse se afastar e nem determinadas verdades, que só o tempo se encarrega em fazer com que possamos entender na medida em quem escolhemos um caminho para seguir.

Fiquei alguns minutos dando exemplos, contando casos e procurando o melhor momento para fazer a pergunta conclusiva: entendeu? E quando tomei coragem de fazer, ela na pura ingenuidade, porém com muita convicção me respondeu: pai eu não entendi nada. E eu abraçando-a simplesmente lhe falei: “Fica tranquila. O tempo se encarregará em te fazer entender”. E continuamos a caminhar.

Essa é uma cena que não tem idade para ocorrer, pois se a maioria da população esteve sempre ausente dessa discussão, principalmente pelo fato de acreditar que se trata de algo ruim como a velha mídia passa, a partir dos infinitos editoriais e da teoria da conspiração é de se imaginar o porquê que a maioria das pessoas não nutre nenhum interesse nem pela política e tampouco por qualquer coisa que dela venha, como por exemplo, as Políticas Públicas. Isso ocorre justamente para que os mesmos vilões da história, governem e possam deixar seus sucessores, ocupando o espaço para que alguém que defenda os interesses da população excluída não tenha vez nem voto.

A velha mídia, principalmente a composta pelos veículos de comunicação daquelas seis famílias, que sozinhas dominam 70% de toda a imprensa, transformou-se na atualidade, sem sombra de dúvidas no quarto poder, em algo que quer determinar quem somos, o que fazemos e principalmente no que podemos pensar e isso não ocorreu por acaso. Há uma rede de interesses por trás que nutre diariamente com informações e conspirações, a começar por grande parte da academia, que para servir ao sistema e às seis famílias, mantém um sistema de ensino desatualizado e o pior, comprometido em combater tudo e todos que coloquem em risco a hegemonia daquelas famílias, da elite brasileira e principalmente do sistema. São fabricadores dos "cozinhas" da atualidade.

Por onde anda o bom senso? Por onde deve andar a verdadeira justiça? Será que ela já existiu em algum momento da história? O que é verdade e o que mentira para quem não participa do processo e age como máquina processadora de informações?

Nem que ficássemos dias, não conseguiríamos dar cabo de tantos assuntos, simplesmente pelo fato de que por trás de cada resposta existe um processo cultural e ideológico, que remete ao que vemos hoje, principalmente nas redes sociais, porém com um link no passado.

É importante entendermos que cada provocação tem uma fonte e cada conspiração também. Bom mesmo é quando sabemos de quem se trata e se é de uma fonte segura, mesmo sendo da oposição, pois assim podemos nos contrapor livremente e defender o que acreditamos ser  uma sociedade do futuro: uma sociedade justa, fraterna e igual para todos e todas.

Apenas algo me arrisco a afirmar: no passado tínhamos uma sociedade menos violenta do que a de hoje e porque não dizer mais interessada. Não que a luta do bem conta o mal seja algo novo, pois sempre existiu e não vai acabar tão cedo, pois se nutre nas entrelinhas da teoria da conspiração, mas a sociedade da informação ou como a direita que chamar da sociedade de resultados, não tem alma e muito menos tempo para resolver os conflitos que leve tempo para solucionar. Assim, a paz, que devia ser para todos e todas, se torna algo como uma moeda de troca, desde que o indivíduo esteja alinhado e disponível para o sistema.

Não estou pessimista e sem um tanto realista e é por isso que luto tanto para levar uma mensagem positiva por onde ando.

Qual a solução para esse impasse que vivemos? Amar mais, ser mais tolerante, aprender a ouvir mais do que falar, brigar apenas pelo que achamos justo e, sobretudo participar, pois a participação nos oferece as verdades e as mentiras, a partir do nosso ponto de vista e isso possibilita determinarmos, com mais segurança, quem elegemos como nosso representante, seja em que espaço político for.

Duas frases para reflexão:

“Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência”. (Karl Marx)

“Poder é toda chance, seja ela qual for, de impor a própria vontade numa relação social, mesmo contra a relutância dos outros”. (Max Weber)

Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Coordenador do Programa de Capacitação Continuada
em Gestão e Políticas Públicas da Fundação Perseu Abramo
toni.cordeiro1608@gmail.com

terça-feira, 11 de março de 2014

A quem interessa um golpe na democracia?

Tortura Nunca Mais!

Quero iniciar essa conversa afirmando que um golpe não necessariamente é o que já foi. Ou seja, militares nas ruas, direitos políticos cassados, beatas marchando e entregando freiras e padres progressistas à tortura e à morte, milhares assassinados e torturados, a imprensa golpista em êxtase e as empresas bancando financeiramente as armas, a tortura e toda sacanagem. Um golpe pode ser uma ação de traição, por exemplo, uma série de notícias para confundir a cabeça do povo, um partido ou um político que se vende ao sistema econômico global, alguém que vira um corrupto e tantas outras pequenas coisas que vão minando a resistência democrática e que diariamente assistimos. Que tal pegarmos como por exemplo a Ação Penal 470, que foi tratada até o momento como vingança e não como justiça?

Tenho sérias divergências com quem acredita que mais vale fazer pequenas ou grandes sacanagens para manter ou chegar ao poder alguém que consideramos que vai fazer um bom governo ou um bom mandato, do que deixar que alguém que já é sacana de papel passado chegar lá. Por exemplo, a justificativa do chamado “caixa dois” para o financiamento das campanhas milionárias. Que diferença tem? Por acaso os recursos não sairão das mesmas fontes? Não afetarão as mesmas pessoas na sociedade? Que diferença há se vai para o bolso de alguém ou se para os cofres de uma empresa de marketing político?

Isso não quer dizer que se as empresas quiserem financiar uma campanha não seja possível. Não vejo qual é a lógica de uma empresa financiar um partido ou uma pessoa de esquerda, mas até dá para entender. Porém criar esquemas durante uma gestão justamente para isso, além de ser imoral é crime contra a humanidade.

Nos cursos que tenho ministrado de Gestão Pública por várias partes do país, pela Fundação Perseu Abramo, tenho provocado uma ampla discussão com os participantes, a se iniciar pelo papel de cada um na sociedade e também qual é o projeto de vida de cada participante. Creio que tudo começa por um projeto de vida pessoal.

Fico horas pensando o que faz uma pessoa pedir novamente os militares de volta, ou ainda apoiar uma reedição da tal marcha das beatas e direitosas pela liberdade. Que liberdade? Ou ainda pedir um Fora Dilma, mesmo sabendo que as ditaduras militares assassinaram e torturaram milhares de pessoas na América Latina somente por prazer e por poder. Das duas uma: ou se trata de uma pessoa completamente alienada e analfabeta política ou se trata de uma enorme sacana, inimiga de democracia e inimiga do povo brasileiro.

Já afirmei anteriormente que um processo eleitoral, pelo seu teor democrático, tem também como finalidade, fazer com que as pessoas se exponham livremente, mesmo que sejam nazistas. É muito bom que todos os monstros saiam das tocas para sabermos quem é quem. Acabo de excluir algumas delas do meu relacionamento político, social e principalmente das minhas possíveis amizades. Até porque daqui para frente estaremos em lados opostos e projetos completamente diferentes.

Depoimentos de D. Paulo Evaristo Arns em seu livro, transcritos abaixo, expõem a crueldade dos militares envolvidos no processo de tortura, assim como seus informantes, que no seio da sociedade, vendiam a ideia de que estavam junto com a população e com as lideranças políticas, chamados na época pelos militares de “terroristas”. D. Paulo relata ainda como um militar norte-americano ensinava a torturar, em detalhes, usando mendigos, as vezes até a morte.

A tortura foi indiscriminadamente aplicada no Brasil, indiferente a idade, sexo ou situação moral, física e psicológica em que se encontravam as pessoas suspeitas de atividades subversivas. Não se tratava apenas de produzir, no corpo da vítima, uma dor que a fizesse entrar em conflito com o próprio espírito e pronunciar o discurso que, ao favorecer o desempenho do sistema repressivo, significasse sua sentença condenatória. Justificada pela urgência de se obter informações, a tortura visava imprimir à vítima a destruição moral pela ruptura dos limites emocionais que se assentavam sobre relações efetivas de parentesco. Assim crianças foram sacrificadas diante dos pais, mulheres grávidas tiveram seus filhos abortados, esposas sofreram para incriminar seus maridos.

Sob o lema de ‘Segurança e Desenvolvimento’, Médici dá início, em 30 de outubro de 1969, ao governo que representará o período mais absoluto de repressão, violência e supressão das liberdades civis de nossa história republicana. Desenvolve-se um aparato de ‘órgãos de segurança’, com características de poder autônomo, que levará aos cárceres políticos milhares de cidadãos, transformando a tortura e o assassinato numa rotina.

De abuso cometido pelos interrogadores sobre o preso, a tortura no Brasil passou, com o Regime Militar, à condição de “método científico”, incluído em currículos de formação de militares. O ensino deste método de arrancar confissões e informações não era meramente teórico. Era prático, com pessoas realmente torturadas, servindo de cobaias neste macabro aprendizado. Sabe-se que um dos primeiros a introduzir tal pragmatismo no Brasil, foi o policial norte-americano Dan Mitrione, posteriormente transferido para Montevidéu, onde acabou sequestrado e morto. Quando instrutor em Belo Horizonte, nos primeiros anos do Regime Militar, ele utilizou mendigos recolhidos nas ruas para adestrar a política local. Seviciados em sala de aula, aqueles pobres homens permitiam que os alunos aprendessem as várias modalidades de criar no preso a suprema contradição entre o corpo e o espírito, atingindo-lhes os pontos vulneráveis.

Que não venham em nome da moralidade humana, onde toda promiscuidade serve apenas para mantê-los no poder econômico global, rifar a democracia que já custou tantas vidas. Afinal se o povo pobre da América Latina come melhor, mora melhora e trabalha melhor, é graças aos governos populares que estão em vigência e é justamente contra isso que a direita, a extrema direita e o PIG lutam. Ou seja, o fim dessas mordomias para os pobres. Estão inclusive incomodados com o pleno emprego, afirmando que num país como o Brasil, um terço dos empregados tem que serem mandados embora, para novamente se criar o exército industrial de reserva, que servia para intimidar quem estar trabalhando e pedia aumento.

Um golpe na democracia só interessa aos inimigos do povo, aos amigos da pobreza, como é o caso da metade da população mundial, que ainda passa fome, aos inimigos da igualdade de condições e a quem interessa confundir a cabeça daqueles que não participaram do momento de terror no Brasil e tampouco sabem juntar o passado com o presente golpista.

Tenho plena convicção que o povo brasileiro não se intimidará a voltar às ruas, se necessário, contra a corrupção por certo e com toda razão, porém também contra toda bandalheira, como por exemplo, o Propinoduto Tucano dos trens e metrôs de São Paulo, algo que já soma 12 bilhões em propinas, mas jamais em favor de um golpe e sim pela manutenção a qualquer custo da Democracia Brasileira.


Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Coordenador do Programa de Capacitação Continuada
em Gestão e Políticas Públicas da Fundação Perseu Abramo
toni.cordeiro1608@gmail.com

sexta-feira, 7 de março de 2014

Vai ter Copa na bola. E na bala?


Os olhos do mundo já estão voltados ao Brasil. Porque somos uma vigorosa economia que concilia crescimento, geração de emprego, distribuição de renda, soberania e democracia institucional.  E porque vai ter Copa. É fato que sediarmos o cobiçado evento da FIFA não aparecia negativamente – embora já houvesse a luta dos Comitês Populares da Copa – até as chamadas Jornadas de Junho de 2013.

As novas palavras de ordem que invadem as redes, “Não Vai Ter Copa”, carregam diferentes sentidos para diferentes grupos. Ali estão pessimistas incorrigíveis, oposição oportunista, movimentos de moradia (legitimamente indignados com remoções arbitrárias), entre tantos. Contudo, a discussão central nesse momento me parece ser a violenta repressão aos protestos e tentativas de recrudescimento da legislação.

Não é demais recordar que as multidões tomaram as ruas em junho passado exatamente após assistirmos cenas de violência contra os jovens (e transeuntes, fotógrafos, jornalistas) por parte da Polícia Militar do Estado de São Paulo. A imagem da jornalista de um grande jornal atingida por bala de borracha chocou o país. É verdade que as noites na periferia de São Paulo são ainda mais sangrentas, mas a exposição pública do uso desproporcional da força catalisou aquela onda de protestos.

Passará a Copa, junho, surgirão novas demandas e a dúvida que fica é qual será o legado disso tudo no campo das liberdades democráticas. A proposta de legislação antiterrorista é erro grave. Erro grave porque não se deve tratar questão social – concordemos ou não com ela -como questão de polícia e, ao mesmo tempo, o arcabouço legal já existente dá conta de coibir grupos minoritários que usam (lamentavelmente) de violência e depredação do patrimônio. E erro grave porque não traz à baila questões mais profundas como a proibição do uso de balas de borracha contra manifestantes e a desmilitarização das PM´s.

Em 2014, o Brasil ganhará com a Copa e o povo brasileiro não admitirá retrocessos. Mas a falta de habilidade dos governos para solucionar conflitos mostra que ainda temos muito a aprender com as ruas.

Vinícius Ghizini
Historiador e membro da Executiva do PT na Macrorregião de Campinas

vinighizini@yahoo.com.br

terça-feira, 4 de março de 2014

O Cavaleiro das Trevas rasga a fantasia

Os super-heróis de criação norte-americana costumam ocultar sua verdadeira identidade, por óbvias razões de segurança. Super-Homem, nas horas comuns, é Clark Kent; o Homem Aranha nasceu Peter Parker; e sob a máscara de Batman oculta-se o milionário Bruce Wayne, que se fantasia de morcego para defender os fracos e os oprimidos.

No filme “O Cavaleiro das Trevas”, a dupla personalidade leva o Homem Morcego a uma séria crise de identidade, a ponto de, ele mesmo, no final, pedir ao comissário Gordon que a polícia passe a tratá-lo como bandido, auto acusando-se pela morte do promotor Hardey Dent. Gordon aceita, dizendo que Batman é o “herói que Gotham City merece, mas não o que ela precisa agora”.
Nosso ainda presidente do Supremo Tribunal Federal tem sido reiteradamente associado à figura de Batman. Cantam-no como herói desta imensa Gotham tupiniquim. Mas ele, como seu congênere americano, sofre também de dupla personalidade.

Joaquim Barbosa chegou ao Supremo pelas mãos de Lula. O ex-presidente da República precisava indicar um novo ministro para a mais elevada Corte do país e queria dar um exemplo e um passo histórico: nomear o primeiro negro. Para Lula, era preciso dar vigor ao seu trabalho de expandir a representatividade popular nos postos de mando do país, em sua obstinação de empoderar as classes populares, os pobres, os fracos e oprimidos.

Nomeou Barbosa sem atentar para seu passado de agente de confiança durante governo da ditadura militar, subordinado a ninguém menos que o polêmico Golbery do Couto e Silva, de melancólica lembrança. Mas trazia no currículo uma obra, uma única obra jurídica de sua autoria em português (tem outra, acadêmica, em francês), que tem por título “Ação Afirmativa & Princípio Constitucional da Igualdade - O Direito como Instrumento de Transformação Social - A Experiência dos EUA”, lançado pela editora Renovar em 2001, em que defende a aplicação das cotas raciais. Foi a senha para que Lula o escolhesse.

Fico imaginando o conflito de nosso super-herói, antigo servidor dos regimes militares, tendo que dirigir-se ao presidente petista para pleitear a nomeação. Deve ter sido doloroso. 

Quis o destino, como diria Sarney, que o menino pobre de Paracatu viesse a ser o relator do mais polêmico processo penal de que se tem notícia, julgado pelo Supremo. 

Imediatamente, os agentes midiáticos, que outrora houveram condenado sua nomeação ao STF, destacando a truculência contra a própria esposa e questionando seu saber jurídico, transformaram-no em herói nacional, em super-herói, no Batman que mudaria o país, salvando-o da quadrilha que tomara de assalto o governo de Gotham City. Pelo voto popular, é verdade, mas isto é apenas um detalhe.

Na mesma velocidade, o negro outrora pobre alçado ao Supremo no bojo de um projeto político de empoderamento das classes populares, esqueceu-se disso. Deu de ombros à própria origem, aos irmãos de classe e de cor. Ignorou que o partido içado ao governo federal pela legitimidade do voto popular precisava implementar medidas que de fato sedimentassem o caminho de libertação dos miseráveis. E embarcou no discurso fácil do falso-moralismo, indo ao cúmulo de transformar um corriqueiro (mas não menos grave) crime de caixa-dois eleitoral em atos de corrupção. Ativa, é verdade, mas corrupção.

Lula saiu da senzala. Dirceu, Genoino, Delúbio, João Paulo, idem. Apostando na luta institucional, disputando o voto do eleitorado brasileiro, chegaram ao topo da pirâmide governamental sem jamais abrir mão dos valores da própria origem, sem jamais ceder às tentações do poder econômico. Barbosa, ao contrário, assimilou rapidamente os valores da Casa Grande. Deslumbrou-se debaixo dos holofotes, ao ver-se nas capas de jornais e revista e nas telinhas de TV. 

A máscara caiu, porém. Pés de barro, não resistiu à verdade lançada à sua cara lavada pelo ministro Luís Roberto Barroso. Deixou escapar, ao vivo e em rede nacional, um esclarecedor “foi pra isso mesmo”, confessando o artificialismo que usou para condenar os réus, ato falho que na mesma hora percebeu, mas era tarde. A confissão estava feita.

Restou, em seu voto, aliás, em seu discurso “baixa-caixão”, lamentar a “triste tarde” em que parte da farsa da AP470 foi desvendada e sepultada pela maioria do Supremo. O milionário Bruce Wayne foi, enfim, revelado à Nação. Nesse discurso, Barbosa cunhou seu próprio epitáfio, cedendo uma vez mais à vaidade e à soberba, falando de si e de sua obra: “aqui jaz um trabalho primoroso”. Primoroso para a classe que ele optou por representar, dos que detêm o poder econômico no país. À luz da justiça e do Direito, uma merda. 

O Brasil não precisa nem merece um falso herói como Joaquim Barbosa.

Luís Antônio Albiero
Advogado na cidade de Americana/SP
laalbiero@yahoo.com.br