Num país que
até 1850 não tinha sequer uma Lei da Terra e que foi a partir dela que nasceu a
propriedade privada, dá para imaginar a enorme dificuldade que um pequeno
agricultor tem de se manter na terra e principalmente viver financeiramente
dela. Muitos pequenos agricultores preferem arrendar suas terras para as
monoculturas ou mesmo vendê-las para algum especulador, que as transformarão em
“casinhas”, gerando com isso, em muitos casos, um crescimento desordenado nas
cidades, sem nenhuma infraestrutura.
Até 2002, ou
seja, antes dos governos do Ex-Presidente Lula e da Presidenta Dilma, havia
muito pouco ou quase nenhum incentivo para a Agricultura Familiar brasileira,
toda lógica do campo estava voltada apenas ao mercado do agronegócio. O negócio
era mais ou menos assim: precariza-se o setor dos pequenos agricultores, esses
migram forçadamente para outros setores e a terra continua nas mãos de poucos.
É evidente
que a situação não está resolvida, mas a ideia de potencializar o MDA -
Ministério do Desenvolvimento Agrário, criado em 1999, porém sem a devida
importância, para tratar com os pequenos agricultores, foi fundamental para a
própria existência e continuidade da Agricultura Familiar, não só com a ajuda
financeira exclusiva, mas, sobretudo com o apoio técnico.
Pela lei brasileira (11.326/2006), o agricultor familiar é
definido como aquele que pratica atividades ou empreendimentos no meio rural,
em área de até quatro módulos fiscais, utilizando predominantemente mão de obra
da própria família em suas atividades econômicas. A lei abrange, ainda,
silvicultores, quilombolas, aquicultores, extrativistas e pescadores.
É importante ressaltar que 70% dos alimentos consumidos no país vem do
cultivo da terra realizado por pequenos proprietários rurais, que é considerado
pela ONU um exemplo no setor. Porém, apesar de tudo isso há uma incerteza
quanto ao futuro desse setor e os trabalhadores do campo, no entanto, cobram
mais investimentos.
Só para se ter uma ideia da potencialidade do setor, no país,
84,4% dos estabelecimentos rurais pertencem à agricultura familiar, que
empregam quase 75% da mão de obra do setor agropecuário. Em contrapartida,
somente 24,3% das áreas ocupadas por estabelecimentos agrícolas são
administradas por pequenos proprietários, resultado da falta de política
agrária no país e do processo da luta no campo, onde milhares de camponeses
foram expulsos das suas terras.
Segundo Fabiana Dotto, em sua Dissertação de Mestrado, realizada
em 2011: “Mais importante é o
número de pessoas ocupadas na atividade. Segundo o MDA (2009) a agricultura
familiar ocupa 15,3 pessoas a cada 100 hectares, contra apenas 1,7 pessoas da
agricultura não familiar”. A produção da Agricultura Familiar é voltada
principalmente ao mercado interno. Ela é responsável pela plantação de 70% dos
alimentos consumidos no país – como 70% do feijão, 87% da mandioca, 58% do
leite e 46% do milho.
Segundo o Governo Federal, o Plano Safra para
Agricultura Familiar 2012/2013, anunciado em junho, terá R$ 22,3 bilhões, sendo
que R$ 18 bilhões serão para crédito rural. Uma quantia razoável, porém
insuficiente para grande parte dos agricultores. Somente uma profunda reforma
agrária será capaz de socializar a terra no país e colocar nela quem de fato
produz para a mesa dos brasileiros.
No Censo
Agropecuário de 2006 foram identificados 4.367.902 estabelecimentos de
agricultores familiares, o que representa 84,4% dos estabelecimentos
brasileiros. Este contingente de agricultores familiares ocupava uma área de
80,25 milhões de hectares, ou seja, 24,3% da área ocupada pelos
estabelecimentos agropecuários brasileiros. Estes resultados mostram uma
estrutura agrária concentrada no país: os estabelecimentos não familiares,
apesar de representarem 15,6% do total dos estabelecimentos, ocupavam 75,7% da
área ocupada. A área média dos estabelecimentos familiares era de 18,37 ha, e a
dos não familiares, de 309,18 ha.
Apesar dos
avanços, algo está no centro da preocupação nacional sobre a continuidade da
Agricultura Familiar no país. Além dos governos nacionais anteriores, mostraram
claramente sua forte ligação apenas com o agronegócio e esse processo continuar
em vários estados e na maioria dos municípios, o mais grave é a falta de
interesse dos jovens de origem rural pela “vida no campo”. Segundo Fabiana: “A desvalorização da vida no campo
denota o interesse maior em permanecer na cidade para esses jovens de famílias
rurais. A cidade é a promessa de futuro melhor, onde se encontram as
oportunidades de trabalho e diversão”.
Os problemas
vão desde a falta de Políticas Públicas voltadas ao setor, sejam estaduais ou
municipais, como por exemplo, o desenvolvimento de um Plano Municipal de
Desenvolvimento Rural voltado ao setor, apoio à infraestrutura, falta de
escolas técnicas rurais que ajudasse a envolver os jovens e principalmente
atividades de cultural e lazer, onde ocupasse parte significativa de seu tempo.
A falta de perspectiva e de tecnologia, que ainda não chegou à maioria das
propriedades rurais fazem com que os jovens se desloquem para as cidades em
busca da realização dos seus sonhos.
Nem tudo
está perdido. Os Territórios da Cidadania, vários projetos federais e o
engajamento de parte da juventude rural em movimentos nacionais, discutem,
elaboram e implantam alternativas de sustentabilidade. Prova disso foi a
realização da V Jornada Nacional do Jovem Rural, em agosto último com a
participação de mais de 300 jovens de várias parte do país, promovida pela Rede
Jovem Rural e com apoio do MDA, mostrando que os jovens estão buscando Novos
Caminhos para a Agricultura Familiar, como era o tema do encontro.
A solução
para esse e outros problemas está nos municípios. Os prefeitos e prefeitas têm
que se envolverem no problema e criarem um setor específico de governo, que
poderia ser um Núcleo de Desenvolvimento Rural, para junto com a população específica,
buscarem alternativas para a manutenção do setor e principalmente o
envolvimento dos jovens, evitando o êxodo para o setor urbano e garantido a
existência futura desse importante setor econômico e social.
A questão é
muito simples: ou se investe no desenvolvimento, fazendo com que os jovens se
sintam atraídos e consequentemente fortaleçam a sucessão de seus pais, ou num
futuro próximo teremos que importar alimentos, visto que o agronegócio já
escolheu o seu caminho, ou seja, exportar praticamente toda a sua produção.
Anexos:
1. Censo Agropecuário de 2006:
http://www.bb.com.br/docs/pub/siteEsp/agro/dwn/CensoAgropecuario.pdf
2. Dissertação de Mestrado de
Fabiana Dotto: “Fatores que influenciam a permanência dos jovens na agricultura
familiar no estado de mato grosso do sul”:
http://site.ucdb.br/public/md-dissertacoes/8201-fatores-que-influenciam-a-permanencia-dos-jovens-na-agricultura-familiar-no-estado-de-mato-grosso-do-sul.pdf
Antonio Lopes Cordeiro
Pesquisador em Gestão Pública e Social
Laboratório de Gestão e Políticas Públicas - Fundação Perseu Abramo
toni.cordeiro1608@gmail.com
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