De que democracia estamos falando? Qual a real diferença política
entre a representatividade e participação? As duas caminham juntas?
Em tão pouco espaço, não tenho a pretensão de responder na íntegra
essas perguntas, até mesmo porque se trata de um debate de cunho ideológico,
repleto de desvios construídos na disputa do poder, porém, é importante
ressaltar alguns aspectos contidos nessas perguntas, que construíram a história
do passado e interferem diretamente na história presente.
John Gaventa, ao escrever o Prefácio do Livro Participação e
Deliberação, afirma: “No mundo todo estão surgindo novos debates sobre como
revitalizar e aprofundar a democracia”. Segundo ele existe um “déficit
democrático” ou uma “perda de vitalidade” da democracia: “Os cidadãos estão se distanciando
das instituições representativas tradicionais, à medida que grupos de interesse
ganham controle sobre as instituições e que a participação passa a ser
impulsionada mais pela lógica do consumo do que por uma postura ativa de
cidadania”.
O autor explica em seu texto que tanto a deliberação quanto a
participação estão sendo usadas por um espectro de atores muito diversos, com
objetivos também muito diversos e que isso traz implicações radicalmente
diferentes na agenda democrática.
Segundo ele, para alguns, a visão democrática é aquela que
privilegia menos governo (tese neoliberal do Estado
mínimo), impulsionada pela perspectiva neoliberal da eficiência e da
austeridade e para outros, trata-se de utilizar novos espaços democráticos e
oportunidades e promover uma ampla transformação social.
Em regras gerais, o que está em jogo é que tipo de sociedade
estamos construindo e que sociedade queremos para o futuro e no centro dessa
análise está metade da população mundial que ainda se encontra fora das
estatísticas econômicas e de desenvolvimento.
Partindo do pressuposto que ainda é um tabu estabelecer um
processo de governância, citado por Yehezkel Dror, como sendo o ato de governar
a várias mãos, qualquer iniciativa de governo que se transforme numa ferramenta
com resultados concretos, que trabalhe a fundo tanto a participação como a
deliberação como uma ação do próprio governo, passa a ter uma importância
significativa, tanto do ponto de vista da gestão como principalmente pelos
resultados políticos obtidos a partir da experiência, porém para que isso
ocorra é necessário cumplicidade e compromissos claros das pessoas envolvidas
com o projeto em construção.
Nem estou me referindo aos Conselhos Municipais, que não vejo o
menor sentido de serem apenas consultivos, mas da construção do que chamamos da
Arquitetura da Participação, com todas suas ferramentas: fóruns, conferências,
encontros e outros.
Assim sendo, trabalhar de forma participativa e com transparência,
requer antes de qualquer coisa, mudanças de postura do gestor com relação ao
poder e principalmente em relação à forma de administrar uma instancia de
poder, porém isso só é possível se o projeto que está em sua mente como meta de
vida não for individual e sim coletiva, construída a várias mãos.
A democracia não pode servir de pretexto para punir de forma
injusta ou privilegiar quem quer que seja, ferindo o direito da maioria.
A partir da cultura individualista concebida numa sociedade
capitalista e de consumo, por onde todos os serem humanos passam desde seu
nascimento até sua vida adulta, o ato de sair do individual para o coletivo,
onde se abandonem às posições pessoais e se valorizem as posições coletivas,
requer uma postura humanista e, sobretudo política, se sobrepondo a qualquer
situação que vise à valorização do indivíduo ante a necessidade da população e
em especial a que mais necessita e isso possa resultar na inclusão dessas
pessoas e no resgate coletivo do direito à cidadania, visando à construção de
uma sociedade justa e igual para todos e todas.
A experiência de um trabalho em grupo só faz sentido para quem
está preparado a mudar se necessário e fazer a defesa de sua proposta como mais
uma apresentada e não como soberana, pois a verdade de cada um ou de cada grupo
representa o somatório dos diversos pensamentos e nesse somatório está contido:
interesses, desejos, vínculos afetivos e posições ideológicas e o que poderá
unificar esses pensamentos e materializá-los é a construção de forma coletiva e
ideológica do projeto central, aliado ao compromisso de cada um em fazer esse
projeto dar certo.
Não é que a democracia esteja em crise, mas em constante ebulição,
acometida pelas investidas das forças conservadoras e reacionárias, através de
seus representantes legais ou não. Para isso, tem a velha imprensa golpista e
todo aparato ideológico, que às vezes está presente num determinado personagem
numa simples novela.
O sonho de Paulo Freire era ver uma sociedade reinventando-se de
baixo para cima, onde as massas populares tivessem na verdade o direito de ter
voz e não o dever apenas de escutar. Assim como ele acredito que isso seja
possível e em experiências como a de Artur Nogueira com o Grupo Gestor de
Integração e Planejamento e principalmente com a de hoje, levando conhecimento
e um forte debate nas diversas regiões do país, estamos plantando uma semente e
se essa semente for bem cuidada, num futuro próximo o “Compromisso com o
Futuro” será uma tarefa de todos e a geração futura poderá dizer que na
história de qualquer cidade, que teve um governo que teve a coragem de
reinventar o próprio ato de governar. Assim foi Artur Nogueira.
Mais vale uma verdade, mesmo que tenha que ser contada mil vezes
ao dia, do que a teoria da conspiração, que ronda e invade as cabeças das
pessoas que vagam perdidas.
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